Título: O Orçamento de 2010
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 29/12/2009, Notas e informações, p. A3
Embora tenham tido tempo suficiente para discutir, modificar e melhorar a proposta de Orçamento da União para 2010, enviada pelo governo no fim de agosto, os congressistas só conseguiram aprovar o texto na terça-feira da semana passada, com muitas alterações feitas pelo relator, deputado Geraldo Magela (PT-DF), quando faltavam apenas 28 minutos para o início do recesso parlamentar.
Evitou-se, felizmente, a repetição de um fato ocorrido em dezembro de 2005, quando o Congresso não conseguiu votar o Orçamento do ano seguinte antes do recesso e só o fez em abril de 2006, razão pela qual, nos primeiros meses daquele ano, o governo só pôde gastar um duodécimo do Orçamento do ano anterior, e apenas para pagamento de despesas de custeio. Essa limitação afetou a atuação do governo, que já não era brilhante, e prejudicou o País.
Mesmo tendo sido aprovado a tempo desta vez, o Orçamento para 2010 não garante um desempenho melhor do governo Lula. A proposta original já era marcada pela preocupação do governo com a eleição de 2010. O Congresso acentuou algumas das características eleitorais do projeto.
A previsão de gastos com salários e encargos, originalmente de R$ 168 bilhões ? 9,2% mais do que a despesa estimada para 2009 ?, incluía a criação de 77.782 vagas. É mais do dobro de vagas abertas em 2009 (33.667 cargos novos). Mas, em vez de cortar essas despesas, como era desejável, o Congresso as elevou para R$ 183,8 bilhões, ou 9,4% acima do valor original. A Câmara dos Deputados foi beneficiada com aumento de R$ 421 milhões em seu orçamento e o Senado, com R$ 295,7 milhões, para um possível aumento salarial de seus servidores.
Ao reservar R$ 29,9 bilhões para as obras do PAC, o Congresso deu grande ajuda à candidatura presidencial de Dilma Rousseff. O governo utiliza esse programa como seu principal instrumento de propaganda político-eleitoral. A proposta orçamentária original previa R$ 22,5 bilhões para o PAC. A essa quantia o relator acrescentou R$ 7,3 bilhões.
Mas o aumento das dotações do PAC está muito longe de significar sua dinamização ou ampliação. Embora seu prazo esteja terminando ? pois suas obras deveriam ser concluídas em 2010 ?, a grande maioria de seus projetos ainda não saiu do papel. Só 9,8% foram concluídos até agora, outros 28,6% estão em execução e 61,6% (quase dois terços) ainda nem foram contratados.
O governo queria remanejar livremente até 30% dos recursos destinados ao PAC, redirecionando sua aplicação sem necessidade de consulta prévia ao Congresso. Isso lhe daria grande margem de manobra, podendo, como advertiu o deputado Ronaldo Caiado (DEM-GO), utilizar o dinheiro para fins eleitorais. A oposição queria reduzir a margem de remanejamento para 10%, mas acabou aceitando a redução para 25%.
Em outro recuo, o relator aceitou retirar as cerca de 2 mil emendas que acrescentara em seu relatório, no valor total de R$ 14 bilhões, o que praticamente eliminava a possibilidade de os demais parlamentares apresentarem suas próprias emendas. O acordo fechado com a oposição, segundo o qual esse valor será distribuído proporcionalmente pelas bancadas dos Estados, permitiu que o relatório fosse votado diretamente pelo plenário, sem passar ? como seria normal ? pela Comissão Mista do Orçamento.
Para conseguir acomodar tantos interesses, o relator engordou a arrecadação prevista para 2010 em R$ 23,8 bilhões. Entre outros artifícios, elevou em R$ 16 bilhões a previsão de receitas atípicas, como os depósitos judiciais, entre os quais incluiu até os que não têm origem em tributos. O Ministério do Planejamento contribuiu para essa manobra, ao comunicar ao Congresso um "ajuste" de R$ 3,8 bilhões nas receitas de 2010. Assim, permitiu o aumento dos recursos previstos para os Ministérios da Saúde, dos Transportes, da Cultura, do Planejamento e da Defesa, além da Presidência da República.
O que se espera é que, mesmo tendo sido emendado e votado dessa maneira, o Orçamento de 2010 seja executado com competência e responsabilidade.