Título: Parentes temem por destino de opositor
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 29/12/2009, Internacional, p. A7

'Eles ameaçaram matá-lo', diz irmão de sequestrado

O teólogo e ativista iraniano Emaddedin Baghi, de 54 anos, diz estar sempre de malas prontas para a prisão, desde que se tornou um dissidente. Mas na manhã de ontem Baghi foi pego de surpresa. Às 6h45, quatro homens armados e não uniformizados invadiram sua casa, agrediram o cunhado dele violentamente, ameaçaram a mulher e as duas filhas do casal e o levaram sem deixar pistas. Até o fim da tarde de ontem, a família não tinha notícias sobre seu paradeiro.

"Não sabemos onde ele está, por que ou por quem foi levado", disse ao Estado, por e-mail, o irmão de Emaddedin, Abuzar Baghi. A família de Baghi teme que ele tenha o mesmo destino de Ali Mousavi, morto no domingo durante confrontos entre policiais e opositores em Teerã. Ele era sobrinho do candidato de oposição nas eleições presidenciais de junho, Mir Hossein Mousavi.

A suspeita é que Baghi tenha sido levado por milicianos da Guarda Revolucionária, à paisana. Infiltrados nos bairros onde viviam, eles foram extensamente usados pelo regime para identificar e prender dissidentes logo após a Revolução Islâmica, em 1979, instaurando um clima de desconfiança que perdura até hoje entre os iranianos.

"Eles ameaçaram meu irmão de morte. Um dos homens armados disse que a vida dele seria curta demais para enxergar qualquer futuro quando se despedia da família, dizendo à mulher e às filhas um verso do Alcorão sobre tolerância e paciência em tempos difíceis", escreveu Abuzar.

"NÃO TELEFONE"

O sobrinho de Baghi, o jornalista Mohammad Ghochani, está preso desde as eleições. A mulher e a filha têm sido chamadas a depor e também estão sob ameaça de prisão. O Estado tentou contato com a família por telefone, após as eleições, mas recebeu um e-mail de Abuzar: "A situação, nesses dias, é terrível. Agentes de segurança estão em toda parte. A comunicação por celular e SMS foi cortada. Estamos sob vigilância. Por favor, não telefone para mim ou para meu irmão."

Um dos propulsores da Revolução Islâmica, formado nas madrassas da cidade sagrada de Qom e discípulo do fundador da república, aiatolá Ruhollah Khomeini, Baghi é partidário de uma ala de clérigos cujo pensamento crítico considera o regime atual anti-islâmico. Profundo conhecedor do Islã, Baghi usa o Alcorão para desafiar a política opressora dos aiatolás, que nega direitos humanos, civis e políticos. Por conta disso, já foi preso inúmeras vezes, a última entre o fim de 2007 e 2008, numa solitária sem luz ou ventilação, onde quase morreu.

A motivação, desta vez, teria sido a exibição de um vídeo inédito, pelo serviço em farsi da TV britânica BBC, em que Baghi entrevista o braço direito de Khomeini durante a revolução, Ali Hussein Montazeri, que morreu no dia 19, aos 87 anos.

Montazeri, assim como Baghi, decepcionou-se com o regime que ajudou a levar ao poder e se tornou um ativista pela democracia e os direitos humanos. Baghi é colaborador de diversas publicações reformistas. No diário Fath (vitória, em farsi), publicou reportagens investigativas sobre a execução de 80 intelectuais e ativistas políticos no fim dos anos 90, obrigando o então ministro Ali Fallahian a admitir, pela primeira vez na história do Irã, o envolvimento de agentes da polícia secreta no assassinato de opositores.

DESESPERO

Abuzar Baghi Irmão de Emaddedin

"Não sabemos onde ele está, por que ou por quem foi levado"

"Eles ameaçaram meu irmão de morte. Um dos homens armados disse que a vida dele seria curta demais para enxergar qualquer futuro, quando despedia-se da família, dizendo à mulher e às filhas um verso do Alcorão sobre tolerância e paciência em tempos difíceis"