Título: Al-Qaeda transforma o Iêmen em novo centro de operações
Autor: Chacra, Gustavo
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/12/2009, Internacional, p. A10

Desde 2008, especialistas advertem para o risco de ataques ao Ocidente serem planejados no país árabe

A Al-Qaeda aos poucos transforma o Iêmen no seu novo centro de operações, abandonando o Afeganistão e regiões fronteiriças do Paquistão. Consultorias de risco político, como a Stratfor, já alertavam desde o ano passado sobre os riscos de atentados no Ocidente ocorrerem a partir do país árabe, como talvez tenha sido o caso da ação frustrada no avião que aterrissava em Detroit na sexta-feira. Apesar de ainda não possuir grandes campos de treinamento, a organização aproveita-se da deterioração do Estado iemenita, que enfrenta três conflitos internos simultaneamente.

O presidente Ali Abdallah Salih, com ajuda da Arábia Saudita, combate no norte os rebeldes Houthis, que seguem uma corrente do islamismo próxima dos xiitas - o Iêmen é majoritariamente sunita. Ontem, segundo informações não confirmadas, o líder da organização Abdul Malik Al Houthi, teria sido morto em combates com forças do governo. Há acusações de que o Irã ajudaria o grupo. Os rebeldes negam. "A grande preocupação dos sauditas é que o Iêmen se torne, de vez, um Estado falido. Quanto à insurgência no noroeste, Riad atua fornecendo armas e auxílio técnico-militar ao governo iemenita. Mas seria exagero achar que há uma Guerra Fria entre Arábia Saudita e Irã no Iêmen. Trata-se, sobretudo, de um conflito local", afirma David Bender, analista da consultoria de risco político Eurasia.

No sul, o governo iemenita enfrenta separatistas. O país foi unificado em 1990. O norte havia se tornado independente quando o Império Otomano ruiu no fim da 1ª Guerra. O sul, desde a primeira metade do século 19, era controlado pelos britânicos. Em 1967, ficou independente da Grã-Bretanha e, três anos mais tarde, tornou-se comunista. Os atuais separatistas não adotam viés ideológico e são apenas integrantes de tribos que se opõem ao governo. Segundo Bender, "ao combater com firmeza a rebelião xiita no noroeste, o governo iemenita busca enviar uma mensagem inequívoca aos separatistas do sul do país: não busquem as armas, ou os próximos serão vocês".

Com os dois conflitos praticamente transformando o Iêmen em uma espécie de Líbano na guerra civil, com um poder central quase inexistente e o território dividido entre facções rivais, ficou fácil para a Al-Qaeda crescer. A organização, em 2000, explodiu o destroier americano USS Cole, matando 17 marinheiros. Em setembro do ano passado, dez pessoas foram mortas em explosões diante da Embaixada dos EUA em Sanaa.

Duas facções da Al-Qaeda, uma da Arábia Saudita e outra do Iêmen, unificaram-se em janeiro sob o comando de Nasir al Wuhayshi. Hoje, segundo especialistas, ele se tornou mais poderoso até do que Osama Bin Laden dentro da organização, apesar de não ter o mesmo simbolismo.