Título: Com crise, participação nos lucros cresce 36%
Autor: Rehder, Marcelo
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/12/2009, Economia, p. B1

Na Volks, 18,2 mil funcionários tiveram ganho extra de R$ 8 mil

Mesmo com a crise financeira mundial, os trabalhadores brasileiros conseguiram negociar acordos de participação nos lucros ou resultados (PLR) que garantiram o pagamento de valores até 36% maiores que os alcançados em 2008.

Os 18,2 mil trabalhadores da Volkswagen em São Bernardo do Campo, no ABC paulista, e em Taubaté, interior do Estado, por exemplo, receberam este ano R$ 8.477, o que representa um aumento de 36,4% em relação aos R$ 6.214 pagos no ano passado.

"Aproveitamos o momento diferenciado que a Volks viveu durante a crise financeira mundial e buscamos um bom acordo", informa o coordenador da comissão de fábrica da montadora em São Bernardo, José Roberto Nogueira da Silva, o Bigodinho.

Os pagamentos da PLR começaram no primeiro semestre, com o depósito da primeira parcela, no valor de R$ 3,5 mil, em maio. Os restantes R$ 4.947 foram pagos dia 14 de dezembro.

No ABC, os 13 mil trabalhadores da montadora receberam ainda bônus de R$ 450 referente a sábados trabalhados que não constavam do acordo com o sindicato da categoria.

Os sindicalistas estimam que a produção de veículos deve crescer cerca de 15% este ano. Mesmo com as jornadas extras, na fábrica de São Bernardo devem ser produzidos cerca de 305 mil veículos, abaixo da meta de 310 mil unidades, de acordo com o diretor do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC e funcionário da Volks Francisco Duarte de Lima, o Alemão.

"Negociamos para que a fábrica garantisse o valor, mesmo que a produção não atingisse o planejamento do ano", afirma Alemão.

O dinheiro da PLR representa um reforço de caixa importante para os trabalhadores individualmente e para a economia em geral, pois boa parte desses recursos deverá ser destinado ao consumo de curto e médio prazos, o que contribui para o aquecimento da economia.

ÀS COMPRAS

O metalúrgico Francisco Carlos Bonilha Soto, de 46 anos, que é modelador na fábrica da Volkswagen do ABC e completa em janeiro 31 anos na empresa, planejou várias compras.

Além de móveis para a casa, ele deu um notebook de presente de Natal para as filhas Natacha, de 22 anos, que terminou o terceiro ano de psicologia, e Nayara, de 17, aluna do terceiro ano colegial. "A maior riqueza que a gente pode dar para os filhos é estudo", diz.

Levantamento da subseção do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) do Sindicato dos Metalúrgicos de Taubaté e Região indica que a PLR injetou cerca de R$ 95,3 milhões na economia local. O montante representa aumento de 18,6% em relação aos R$ 80,4 milhões estimados no ano de 2008.

Os 2,4 mil trabalhadores da LG Eletronics de Taubaté receberam R$ 4 mil de PLR, o que significa 8,2% mais em relação ao valor do ano passado. A empresa produz telefones celulares, monitores e notebooks.

No setor da alimentação, os 6 mil trabalhadores das fábricas da Nestlé no Estado de São Paulo conquistaram PLR variável de 90% do salário mais um valor fixo de R$ 2,9 mil.

"O ano de 2008 foi marcado pela crise, mas ela só prejudicou os negócios na parte final do ano, o que não prejudicou muito o pagamento de PLR aos trabalhadores neste ano", explica Carlos Siqueira, diretor do Hay Group do Brasil, empresa global de consultoria de negócios e Recursos Humanos. "Achamos que pode ter mais reflexos nos lucros que vão ser distribuídos em 2010."

CONSTITUIÇÃO

Segundo acompanhamento feito pela consultoria, quase 99% das empresas brasileiras pagam PLR ou alguma remuneração variável de curto prazo.

"É um dos níveis mais altos no mundo", constata Siqueira. Para se ter uma ideia, o porcentual de empresas que pagam esse tipo de benefício na Argentina é de 70% e na Venezuela é de 40%.

Prevista na Constituição desde 1946, a participação dos trabalhadores nos lucros ou nos resultados das companhias ganhou força em meados dos anos 90. Em 1994, foi criada uma legislação específica para o pagamento desse benefício, por meio de medida provisória.

Naquela época, as empresas se viram forçadas a reduzir custos e ganhar produtividade diante do aprofundamento da abertura comercial e barateamento das importação

"Além de garantir benefícios fiscais, no início o pagamento da PLR facilitava as negociações sindicais quando não era possível dar aumentos reais de salários aos trabalhadores", lembra Siqueira.