Título: Ataque foi um dos mais ousados sob Uribe
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Fonte: O Estado de São Paulo, 23/12/2009, Internacional, p. A10

Para analistas, grupo quer atrapalhar planos de 3.º mandato, mas o efeito pode ser oposto

Se for confirmado que as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) estão por trás do sequestro do governador de Caquetá, Luis Francisco Cuéllar, esta terá sido uma das mais ousadas ações da guerrilha esquerdista durante o governo do presidente Álvaro Uribe. "O objetivo das Farc seria justamente refutar a versão do governo de que o grupo estaria morto graças ao programa de Segurança Democrática de Uribe", disse ao Estado Carlos Medina, cientista político da Universidade Nacional da Colômbia.

Os últimos dois anos foram marcados por grandes derrotas para as Farc. Em março de 2008, o porta-voz do grupo, Raúl Reyes, foi morto em um ataque contra seu acampamento no Equador. Dois meses depois, o número 1 da guerrilha, Manuel Marulanda (ou Tirofijo), morreu de causas naturais.

Em julho do mesmo ano, uma operação militar do Exército conseguiu libertar 15 reféns da guerrilha, entre eles a ex-candidata à presidência Ingrid Betancourt e três americanos. E há cinco meses, o anúncio da cessão de sete bases colombianas aos EUA complicou ainda mais a situação da guerrilha.

"É claro que as Farc saíram enfraquecidas dessa sucessão de golpes. A questão é que o sequestro de Cuéllar, longe de ser uma ação que mostra uma recuperação consistente da guerrilha, parece ter sido uma operação estratégica destinada a mostrar que ela ainda pode ser um problema em muitas regiões do país - e isso parece ser verdade", diz o analista político Gabriel Murillo, da Universidade dos Andes. "A guerrilha tem uma capacidade de adaptação grande que fica evidente nas suas décadas de história. E nos últimos anos ainda tem contado com os recursos do narcotráfico."

Na semana passada, as Farc anunciaram uma aliança com o Exército de Libertação Nacional (ELN) contra Uribe. Para os analistas, é possível que o grupo esteja tentando, com o planejamento de novas ações, atingir a popularidade do presidente colombiano para complicar suas ambições de concorrer a um terceiro mandato.

Mas Murillo diz que, caso o objetivo seja esse, no longo prazo a estratégia pode ser um tiro no pé: "Se por um lado, com esse sequestro, as Farc mostram que ainda estão ativas, por outro, reforçam os discursos e argumentos belicistas do governo."

Para Uribe concorrer nas eleições de maio, seria necessário uma mudança constitucional. Seus aliados alegam que a reforma é essencial justamente porque o presidente é o único capaz de consolidar o legado de sua Segurança Democrática. Dentro dessa lógica uribista, se as Farc ainda são um problema, nada mais natural que manter no poder o líder que, se não derrotou a guerrilha, ao menos foi o que chegou mais perto disso.