Título: China avança nos EUA e Brasil patina
Autor: Landim, Raquel
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/01/2010, Economia, p. B3

Apesar da crise, chineses ganham 3% de participação e representam 18,8% das importações americanas

A crise derrubou a demanda nos Estados Unidos e prejudicou exportadores de diversos países. Os chineses sentiram o baque, mas seguiram avançando, enquanto os brasileiros só mantiveram sua fatia no mercado americano graças às commodities. A concorrência com a China é um dos principais obstáculos para o País nos EUA.

Em setembro de 2008, quando quebrou o Lehman Brothers, as empresas chinesas respondiam por 16% das importações americanas. Em setembro do ano passado, chegaram a 18,8% - quase três pontos porcentuais a mais, revela pesquisa da Confederação Nacional da Indústria (CNI).

A participação do Brasil no mercado americano permaneceu em 1,38% no período, porque petróleo e celulose ocuparam o espaço deixado por aviões, calçados e carros. "Quando o mercado desaqueceu, as fragilidades brasileiras apareceram", disse a consultora da CNI, Sandra Ríos.

Para a especialista, o câmbio é questão-chave para entender o avanço chinês em meio à crise. A fim de estimular as exportações, a China voltou a atrelar sua moeda ao dólar, incrementando a competitividade que já possui graças aos baixos custos tributário e de mão de obra.

O real foi uma das moedas que mais se valorizaram em relação ao dólar e as empresas brasileiras perderam contratos no exterior. A fabricante de móveis Erval perdeu seu principal cliente nos EUA e hoje exporta um volume pequeno para o país. "O problema não foi a crise, mas o câmbio. Fomos substituídos por fornecedores chineses", diz o gerente de exportação, Aquiles Cedeño.

As vendas para os Estados Unidos já vinham crescendo menos que a média das exportações brasileiras nos últimos anos. A crise foi o estopim dos problemas e pequenas e médias empresas, que tentavam explorar o mercado americano, tiveram de desistir por causa da conjuntura desfavorável.

É o caso de um grupo de fabricantes de gesso de Pernambuco, que tinha um escritório em Miami. "A crise inviabilizou o negócio. Tivemos de fechar as portas", contou o presidente da Supergesso, Josias Inojosa de Oliveira Filho. Os fabricantes de gesso pernambucanos ainda exportam para Angola e América Central.

Desde 2001, quando entrou na Organização Mundial de Comércio (OMC), a China mais que duplicou sua presença nos EUA. Em 2001, o país respondia por 8,6% das importações americanas. Hoje, tem 10 pontos porcentuais a mais. A fatia do Brasil oscilou de 1,2% em 2001 para os atuais 1,38%.

O caso mais emblemático da perda de competitividade do Brasil em relação à China e outros países asiáticos é o de calçados. Em 2002, a China vendia US$ 9 bilhões em sapatos para os americanos. Em 2008, chegou a US$ 14 bilhões. O Vietnã saiu de inexpressivos US$ 124 milhões para US$ 1,2 bilhão.

O espaço ocupado pelos asiáticos era do Brasil. Em 2002, os calçadistas brasileiros vendiam US$ 1,25 bilhão para os americanos. Em 2008, menos da metade, US$ 515 milhões. Já a Itália, apoiada em suas marcas, manteve-se entre US$ 1,1 bilhão e US$ 1,2 bilhão.

"Antes da China, o Brasil resolvia os problemas nos EUA reajustando preços. Agora não dá mais", disse o diretor da Star Export, João Carlos Hartz, trading que exporta calçados de fabricantes como Paquetá ou Schmidt Irmãos.

ABANDONO

Para o vice-presidente da Associação Brasileira de Comércio Exterior (AEB), José Augusto de Castro, a falta de prioridade para os Estados Unidos na política externa também foi determinante na perda de espaço do Brasil. "O governo deliberadamente abandonou o mercado americano", disse.

Conforme dados fornecidos pelo Itamaraty, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva liderou 64 missões empresariais desde 2003 até julho de 2009: 18 para América do Sul e Central, 17 para a Europa, 14 para a África e 10 para a Ásia - mas nenhuma para os Estados Unidos.

O secretário de Comércio Exterior, Welber Barral, admitiu que o fraco desempenho das exportações no mercado americano é preocupante. "Vamos fazer um esforço para recuperar terreno, mas nunca deixamos de investir nos Estados Unidos."

O governo ainda tem poucas iniciativas concretas. As principais são negociar um acordo de facilitação de comércio e investimentos, incrementar a parceria entre o Ministério do Desenvolvimento e o Departamento de Comércio americano, e reforçar o fórum de CEOs.