Título: Oposição resiste à repressão
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Fonte: O Estado de São Paulo, 22/12/2009, Internacional, p. A12
Para analistas, ela se alimenta de 'revolta estrutural'
Os protestos que deram o tom do funeral do grão-aiatolá Hossein Ali Montazeri são um sinal de que as prisões e ameaças contra opositores não estão conseguindo sufocar o movimento reformista no Irã. A opinião é do historiador especialista em política iraniana Shaul Bakhash, da Universidade George Mason, nos EUA.
"Há um descontentamento estrutural com o governo Ahmadinejad. E foi isso que deu forças tanto para os protestos contra as fraudes eleitorais, em junho, quanto para as manifestações de ontem", disse Bakhash ao Estado. "Ficou claro que, apesar da repressão, o movimento pró-reformas ainda dará trabalho ao governo." Há seis meses, as suspeitas de fraude na eleição vencida por Ahmadinejad levaram milhares de pessoas às ruas e mergulharam o Irã em sua pior crise interna desde a Revolução Islâmica de 1979. Centenas de opositores foram presos e 26 morreram, nos choques que expuseram as profundas divisões entre a população e as elites clericais do país.
Ahmadinejad assumiu seu novo mandato contestado nas ruas e pressionado por parte de sua própria base conservadora. "Mas seu governo ainda tem mantido alguns pilares importantes, como o apoio da Guarda Revolucionária", diz Sanam Vakil, especialista em Irã da Universidade Johns Hopkins.
No dia 7, alunos da Universidade de Teerã voltaram a protestar durante as comemorações do Dia do Estudante. Fotos do líder supremo, Ali Khamenei, e do líder da Revolução Islâmica, Ruhollah Khomeini, foram queimadas - numa cena impensável há alguns meses. Mais de 200 pessoas foram presas.
Montazeri fazia parte de um influente grupo de religiosos da cidade sagrada de Qom que vinha condenando a dura repressão dos protestos e qualificou de ilegítima a eleição presidencial. "Há uma divisão antiga entre os clérigos iranianos e ela se exacerbou com as eleições contestadas e a repressão aos protestos", diz Bakhash. Na última declaração publicada em seu site, no dia 16, Montazeri denunciou a "morte de inocentes" e a "detenção de militantes políticos que pedem liberdade".
O aiatolá participou da revolução de 1979, mas logo rompeu com o regime. Ele não concordava com a execução de prisioneiros e achava que os religiosos deviam servir de conselheiros para os políticos e não tomar o poder para implementar uma "ditadura em nome do Islã".
Ontem, a preocupação das autoridades era a possibilidade de o funeral de Montazeri desatar uma nova onda de protestos. O risco era grande porque, tradicionalmente no Irã, as homenagens duram sete dias após a morte - e, no caso de Montazeri, ainda coincidiram com um importante feriado religioso xiita.
"Os iranianos estão descontentes porque Ahmadinejad não fez as melhorias econômicas que prometeu - a inflação e o desemprego estão em alta. Soma-se a isso a revolta com a falta de liberdade e oportunidades políticas e temos uma situação bem complicada para o governo", diz Vakil.