Título: Eletrobrás terá reforço de R$ 14 bi
Autor: Fernandes, Adriana ; Andrade, Renato
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/01/2010, Economia, p. B4

Capitalização será usada para quitar dividendos de R$ 10 bilhões retidos nos anos 70 e 80

A Eletrobrás vai receber um reforço financeiro para sanear as contas, resolver o pagamento de dividendos atrasados há mais de 30 anos e ampliar os investimentos no setor elétrico. Segundo fontes ouvidas pelo Estado, a capitalização em estudo pode chegar a R$ 14 bilhões. O montante será mais que suficiente para que a estatal quite com seus acionistas os R$ 10 bilhões em dividendos retidos nas décadas de 1970 e 1980.

Oficialmente, o governo confirma apenas as negociações para a quitação desses débitos. "Está em andamento um processo para que a Eletrobrás ajuste as finanças e pague os dividendos", disse Nelson Machado, secretário executivo do Ministério da Fazenda.

O desenho financeiro da operação de capitalização será apresentado nos próximos dias ao ministro Guido Mantega, que voltou de férias esta semana. Segundo os técnicos, a capitalização é necessária para que a empresa possa continuar fazendo investimentos, especialmente em obras incluídas no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), após o pagamento dos dividendos.

A operação é mais uma etapa do processo de saneamento financeiro da empresa, iniciado no ano passado. Em novembro, a estatal aprovou a capitalização de suas subsidiárias integrais por meio da conversão de parte das dívidas dessas empresas em novas ações. Com a troca, equivalente a R$ 11,8 bilhões, a Eletrobrás passou a ter o direito de receber dividendos de suas controladas.

A faxina financeira abre espaço para a retirada das contas da Eletrobrás do cálculo do superávit primário das contas públicas, como foi feito com a Petrobrás. A medida dará mais fôlego à empresa para ampliar investimentos, atendendo um dos objetivos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que é transformar a estatal na "Petrobrás do setor elétrico".

NOVELA

A novela dos dividendos se arrasta há anos. Alegando necessidade de efetuar investimentos, a Eletrobrás reteve o pagamento desse dinheiro, que deve ser repassado aos detentores de ações da empresa. Legalmente, a empresa deve pagar, anualmente, pelo menos 25% de seu lucro na forma de dividendo.

A União, sócio controlador da empresa, reduziu a parcela a que tinha direito no fim do ano passado, quando transferiu ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) o equivalente a R$ 3,5 bilhões em dividendos. Com isso, o volume que o banco de fomento tem a receber passou para R$ 5,3 bilhões. A União reduziu sua parcela para R$ 2,7 bilhões. Os acionistas minoritários têm a receber cerca de R$ 2 bilhões.

A transferência dos dividendos para o BNDES foi entendida por alguns analistas como o primeiro sinal claro da decisão do governo de resolver o imbróglio. "A saída da União do problema do dividendo é, talvez, a medida mais efetiva que podia ser tomada", afirmou Ricardo Corrêa, analista da Ativa Corretora. "Com a União desistindo de receber uma parcela, a decisão passa a ser mais estratégica porque o custo político diminui muito", acrescentou.

O valor da capitalização não está fechado. Segundo uma fonte envolvida nas negociações, o montante de "até R$ 14 bilhões" poderia ser alcançado se o governo optar por uma emissão de ações em valor equivalente aos R$ 10 bilhões dos dividendos mais os R$ 4 bilhões já reservados nas contas da Eletrobrás como Adiantamento para Futuro Aumento de Capital (Afac).

Esses adiantamentos funcionam como uma espécie de reserva feita pelos acionistas para que, na necessidade de aumentar o capital, o gasto efetivo seja minimizado. No caso da Eletrobrás, a União pode abater esses R$ 4 bilhões da parcela que terá de gastar com a subscrição de novas ações, reduzindo assim o impacto da operação sobre os cofres públicos.

"A capitalização é necessária para a saúde da empresa", disse a fonte do governo. O assunto é tratado com discrição na equipe econômica por causa das implicações da medida no preço das ações da empresa, que nos últimos dias subiu com rumores de pagamento de dividendos.