Título: Brasileiros não são invasores, diz Lula em ato a militares mortos
Autor: Mendes, Vannildo ;Scinocca, Ana Paula
Fonte: O Estado de São Paulo, 22/01/2010, Internacional, p. A15

Em solenidade com 18 caixões, presidente confere a vítimas no Haiti Medalha do Pacificador

Em meio aos desencontros entre Brasil e Estados Unidos sobre a ajuda ao Haiti, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva usou ontem a homenagem aos militares mortos no terremoto para ressaltar o papel brasileiro na missão de paz. "O soldado brasileiro nunca foi confundido com invasores estrangeiros, muito pelo contrário", afirmou o presidente. Ele condecorou cada um dos mortos com a medalha do Pacificador, cumprimentou as viúvas e parentes e agradeceu "a bravura" com que os militares atuam na missão de paz do Haiti. "As palavras se tornam frágeis diante da brutalidade dos fatos", lamentou Lula.

Carregada de emoção, a solenidade foi realizada na Base Aérea de Brasília diante dos parentes das vítimas e contou com a presença de todo o ministério. Lula também citou no seu discurso os dois civis brasileiros mortos no terremoto: a médica Zilda Arns, fundadora da Pastoral da Criança e o diplomata Luiz Carlos da Costa. Mas as principais honras foram destinadas aos militares, que o presidente qualificou de "destemidos compatriotas". Para Lula, a presença brasileira no Haiti representa "a mais nobre missão humanitária" já efetivada pelas Forças Armadas.

Depois da cerimônia, os corpos foram levados juntamente com os parentes em aviões da Força Aérea Brasileira para sepultamento, hoje, em seus Estados de origem. O primeiro enterro, do major Francisco Adolfo Vianna Martins Filho, ocorreu ontem mesmo, em Brasília.

As histórias das famílias são, em geral, comoventes, como a do cabo Douglas Pedrotti Neckel, morto no desabamento do Forte 22, onde residiam os brasileiros. "Ele estava de malas prontas para voltar para casa", contou o irmão Rogério, com os olhos marejados. "Sua morte prematura causou muito luto e sofrimento à família." Ele contou que atuar no Haiti era o sonho do irmão, que fez o último contato com a família no dia da tragédia. "Ele disse que sentia que a missão estava cumprida." Rogério relatou que, na sua saudação, Lula pôs a mão no seu ombro e disse: "Força, tenham orgulho porque vocês têm um herói na família."

Cely Zanin, viúva do coronel João Eliseu Souza Zanin, paulista de Mirassol, de 46 anos, fez um curto comentário sobre o marido. "Era um homem íntegro e motivo de muito orgulho para seus filhos", disse ela, emocionada. Zanin participava de uma reunião, em companhia de três outros oficiais brasileiros, na sede da missão de paz da ONU, a Minustah, no Hotel Christopher, que desabou.

Outro oficial que morreu ao lado de Zanin foi o coronel Marcus Vinícius Cysneiros, de 42 anos, de Niterói. "Ele era o único militar da família e fez uma carreira com dedicação extrema", disse o irmão dele, Marcelo Cysneiros.

INDENIZAÇÃO

O governo vai conceder R$ 500 mil a cada uma das famílias dos 18 militares mortos no terremoto. O valor deverá ser dividido entre os dependentes do militar morto, de acordo com critérios aplicados na legislação militar.

Além da indenização, o governo também vai oferecer um segundo benefício aos estudantes dependentes. Cada um deles receberá uma Bolsa-Educação de R$ 510 mensais até que o estudante complete 24 anos.

Conforme o regulamento militar, as viúvas receberão pensão vitalícia equivalente ao soldo dos cônjuges, que receberam uma promoção post-mortem, equivalente a uma patente acima. Os parentes ainda terão direito a uma indenização da ONU.