Título: Haiti rejeita proposta brasileira na ONU
Autor: Colon, Leandro ; Chade, Jamil
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/01/2010, Internacional, p. A17

Brasil queria envio de missão internacional para avaliar questão dos direitos humanos no país

O Haiti rejeitou uma proposta do Brasil para que uma missão internacional fosse enviada para avaliar a situação dos direitos humanos no país. Hoje, à pedido do Brasil, a ONU fará uma reunião de emergência em Genebra sobre o tema. Nos bastidores, a preparação do encontro expôs a disputa internacional sobre como lidar com a crise haitiana. O chanceler brasileiro, Celso Amorim, será o único ministro presente. Nem o governo do Haiti enviou um representante de alto escalão.

Para convocar o encontro, o Brasil obteve o apoio de 32 países. A meta do Itamaraty é colocar o debate sobre os direitos humanos no Haiti na agenda e garantir que ele seja considerado na reconstrução do país. "O debate no Conselho de Direitos Humanos da ONU deve contribuir para o exercício da boa governança e do Estado de Direito", disse a embaixadora do Brasil na ONU, Maria Nazareth Farani Azevedo.

A resolução do Brasil pedia que uma missão de governos estrangeiros viajasse ao Haiti para avaliar a questão dos direitos humanos. "Não temos como aceitar isso", disse o encarregado de negócios do Haiti na ONU, Jean Claude Pierre. Segundo ele, o governo haitiano não foi consultado.

Mas a diplomacia brasileira tem outra versão. A rejeição teria sido resultado de pressão dos países ricos, que não querem dar um enfoque de promoção do desenvolvimento para as ações no Haiti - eles preferem manter o foco em temas como segurança e a assistência humanitária. No fim do dia, o Itamaraty retirou da resolução o trecho que se referia à missão.

Americanos e europeus sugeriram que o relator da ONU para o Haiti visite o país. No entanto, Porto Príncipe rejeitou a proposta. Cuba e Rússia também a descartaram. O argumento de Washington é não deixar que a reunião se transforme em um palco para a Venezuela criticar o envio de soldados americanos ao Haiti.

Diplomatas europeus também confessaram na ONU que seus governos duvidam da conveniência da reunião por acreditarem que é cedo tratar do tema enquanto os trabalhos de resgate não estão concluídos. "Não sabemos se a reunião é para promover o Haiti ou o país que convocou a reunião", ironizou um diplomata alemão.

As críticas também saíram de dentro da ONU. A queixa principal é a de que o Itamaraty tentou mudar o protocolo para garantir ao chanceler Celso Amorim uma posição de destaque no evento, discursando antes mesmo dos haitianos.

Para a ONG UN Watch, o encontro de hoje é um "desperdício do tempo, recursos e capital moral da ONU". "Ele não vai alimentar nem curar um só haitiano. Pelo contrário, vai desperdiçar US$ 200 mil (na organização do evento) que poderiam ser usados para outros fins", disse Hillel Neuer, diretor executivo da entidade. Segundo ele, o evento é para mostrar que o Conselho está fazendo algo, enquanto violações no Irã, Cuba e China estariam impunes. Para Neuer, apesar de 32 países terem apoiado a reunião, nenhum atendeu ao pedido de verba da ONU para a proteção dos direitos humanos no Haiti.