Título: Maternidade surge em tendas precárias
Autor: Chade, Jamil
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/01/2010, Internacional, p. A14
Improviso marca partos na capital
Mais de duas semanas após o terremoto, Porto Príncipe começa a dar à luz uma geração de bebês sem casa. São recém-nascidos que crescerão ao mesmo tempo em que o Haiti se reconstrói após o tremor do dia 12. Por volta das 11 horas de ontem, a reportagem do Estado caminhava pelo Hospital Geral da capital quando ouviu gritos de dor de mulheres internadas numa tenda. Eram as contrações de grávidas desabrigadas. Um cartaz na frente da barraca informava: "Maternidade."
Todos os dias nascem novos bebês ali. Ontem pela manhã, pelo menos dois nasceram. Outros viriam à tarde. Com a autorização dos médicos, o Estado assistiu a um dos trabalhos de parto, o de Marie France, de 30 anos, que deu à luz um menino ? ela perdeu a casa com o terremoto.
Apesar da dedicação dos médicos voluntários, as instalações são precárias e sujas. Os bebês nascem em meio a um forte calor das lonas, cheiro ruim, moscas e sujeira. Um balde armazena o sangue do pré e do pós-parto. O sangue é jogado ali mesmo no chão, nas sarjetas das vielas do hospital, para seguir na corrente de água que passa. Numa tenda ao lado, improvisa-se uma espécie de berçário. Estão ali os que nascem no hospital e os que vieram à luz nas ruas depois que as mães perderam as casas no terremoto. Ontem, 18 eram atendidos. Não são raras as brigas entre os haitianos pelas fraldas doadas que chegam a toda hora .
Mas a assistência ali é emergencial. Não há espaço para as mães e os bebês por muito tempo. No fim da tarde, Mamoun, de 38 anos, deixava a tenda com o filho Celestino Victor enrolado numa toalha branca. Ele nasceu terça-feira. Agora, mãe e filho retornam a uma praça de refugiados.
Maior de Porto Príncipe, o Hospital Geral abriga hoje mais de mil feridos pelo tremor. As tendas são distribuídas de acordo com a situação médica das pessoas. A segurança é controlada pelas tropas americanas. Dentro, médicos de vários países trabalham no auxílio às vítimas.
Entre os novos feridos, está Evelin, de 29 anos. No fim da manhã de ontem, Evelin estava deitada num carrinho de mão usado improvisado como maca, à espera de uma vaga na maternidade. Evelin está grávida de oito meses.