Título: Governo usa PAC para sustentar superávit
Autor: Fernandes, Adriana ; Graner, Fabio
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/01/2010, Economia, p. B3

Segundo Tesouro Nacional, economia do governo em 2009 foi de R$ 39,2 bilhões, volume 45% inferior ao verificado no ano anterior

Mesmo lançando mão de artifícios contábeis da ordem de R$ 26,4 bilhões para aumentar as receitas, o governo só conseguiu cumprir a meta de superávit primário ? economia para pagar juros da dívida ? em 2009 recorrendo à dedução de parte dos investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Isso só ocorreu uma vez, em 2006.

De acordo com dados divulgados ontem pelo Tesouro Nacional, o superávit primário do governo central (Tesouro, Previdência e Banco Central) em 2009 foi de R$ 39,2 bilhões, 45% menor que o de 2008. A queda reflete o estrago da crise na arrecadação federal e as ações do governo para estimular a economia, que implicaram aumento de gastos de 15%.

Somente em dezembro, onde se concentrou boa parte da "criatividade fiscal" do governo para inflar as receitas, o superávit primário foi de R$ 1,7 bilhão, o segundo maior da série divulgada ontem pelo Tesouro.

Tradicionalmente, dezembro tem déficit primário, mas, em uma última manobra, o governo antecipou R$ 3,5 bilhões vendendo ao BNDES dividendos a receber da Eletrobrás.

Apesar dos malabarismos para inflar as receitas, o secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin, disse que o governo não cumpriu sua meta fazendo "gol de mão", como criticaram alguns analistas. "Podem dizer que o gol não foi bonito, mas não foi feito fora das regras", disse.

Ele acrescentou que não há nenhuma "qualidade inferior" no esforço fiscal feito pelo governo em 2009 em relação aos anos anteriores. Também salientou que em 2010 a meta de superávit de 3,3% do Produto Interno Bruto (PIB) será cumprida sem abatimentos do PAC.

A meta definida na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para o governo central no ano passado foi de 1,4% do PIB. Sem os descontos permitidos dos investimentos do PAC, o governo não teria cumprido a meta, pois o resultado efetivo de 2009 foi de 1,25% do PIB.

O valor exato dos investimentos do PAC que serão deduzidos da meta em 2009 só será conhecido hoje, quando o BC divulgar o resultado do conjunto das contas públicas (União, Estados e municípios). De qualquer forma, o governo está em situação confortável, pois executou R$ 17,9 bilhões (alta de 58%) em obras do PAC. Segundo Augustin, Estados, municípios e estatais também não cumpriram objetivos da LDO, o que aumenta a necessidade de uso do abatimento do PAC.

Além da dedução dos investimentos na meta, o governo fez uma grande mobilização de caça a receitas para atingir o objetivo fiscal em 2009. Por isso, as empresas estatais transferiram R$ 13,3 bilhões a mais em dividendos para a União na comparação com 2008. Foram também incorporados às receitas R$ 8,9 bilhões em depósitos judiciais e mais R$ 4,2 bilhões transferidos pelo BNDES. Toda essa receita extra engordou o caixa federal em R$ 26,4 bilhões.

Apesar dessas manobras contábeis, as receitas totais do governo central cresceram somente 3,2% em termos nominais, para R$ 739,3 bilhões. No lado da despesa, sob a justificativa de política fiscal de enfrentamento da crise, o governo não fez nenhum controle. Os gastos totais cresceram 15%, para R$ 572,4 bilhões. Somente os gastos com pessoal avançaram R$ 21 bilhões (15,9%) no ano passado, para R$ 151,6 bilhões.