Título: Copom vê inflação tranquila e ganha tempo
Autor: Nakagawa, Fernando ; Graner, Fabio
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/12/2009, Economia, p. B4

Ata do comitê do BC manteve fora do curto prazo a alta de juro e aponta recuperação gradual da economia

A ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), divulgada ontem, desenhou um cenário favorável para a inflação e manteve fora do curto prazo a possibilidade de alta na taxa de juros básica (Selic). O documento evidenciou uma trajetória de recuperação "gradual", mas consistente da economia brasileira. O Copom afirmou que a indústria ainda não esgotou sua capacidade de produção, o que para o colegiado ainda deve levar algum tempo para acontecer, reforçando a perspectiva de os preços seguirem sob controle.

"O Copom avalia que, diante da margem de ociosidade remanescente na economia, evidenciada por indicadores de utilização da capacidade na indústria e do mercado de trabalho, e do comportamento das expectativas de inflação para horizontes relevantes, continuaram favoráveis as perspectivas de concretização de um cenário inflacionário benigno, no qual o IPCA seguiria exibindo dinâmica consistente com a trajetória das metas", diz a ata.

A retomada "gradual" da atividade é uma das expressões-chave para se entender a ata. Isso porque uma trajetória gradual de expansão da economia permitiria que os investimentos que estão sendo feitos pelas empresas amadureçam ao longo do tempo. A maturação dos investimentos amplia a capacidade produtiva ou pelo menos posterga o aparecimento de eventuais gargalos, gerados por demanda de consumo maior que a oferta de bens, que podem deflagrar aumento de preços.

Depois do comunicado divulgado na semana passada, com o anúncio de que a Selic continua estável em 8,75%, analistas esperavam um documento mais duro, sinalizando uma maior proximidade do início de alta dos juros. Mas a ata de ontem ficou muito parecida com a da reunião de outubro, com alguns pequenos ajustes que mostraram um BC mais atento, que saiu do piloto automático, mas ainda confortável com as perspectivas de inflação.

O BC afirma que a trajetória da economia ainda tem incertezas, "que deverão ser dirimidas ao longo dos próximos meses". E que "decisões sobre a taxa básica de juros têm que levar em conta a magnitude dos estímulos introduzidos na economia, cujos impactos econômicos ficarão evidentes ao longo do tempo". Os estímulos são: corte de juros, alta dos gastos públicos e desonerações tributárias, e uma política agressiva de crédito dos bancos públicos.

O economista da Tendências Consultoria Bernardo Wjuniski avaliou a ata como "tranquila" do ponto de vista do cenário de juro. Por isso, ele prevê alta apenas em setembro de 2010. Wjuniski esperava "alguma novidade" mais forte no documento e especula que a falta desse elemento pode ter relação com o os dados do Produto Interno Bruto (PIB) divulgados na semana passada, depois da reunião do Copom, que mostraram um recuperação mais lenta que o esperado. Para o economista, a decisão de manter a Selic não levou o PIB em conta, mas quem redigiu a ata pode tê-lo considerado para manter um tom indicando que a situação de atividade econômica está confortável para o cenário inflacionário.

A economista-chefe da Rosenberg Associados, Taís Zara, avalia que a ata "subiu um pouco o tom", mostrando que o BC tem certeza de que a recuperação da atividade econômica está acontecendo, com redução da margem de ociosidade. "Apesar disso, em termos de inflação, o BC se mostra bastante confortável", disse Taís, lembrando que o documento menciona a deflação nos preços do atacado. Ela afirma que a ata mostra um BC atento, mas avalia que os juros não devem subir em 2010, embora ao longo do tempo a autoridade monetária começará a preparar mais claramente o terreno para alta nos juros.

FISCAL

Com 2009 acabando, o BC já começou a estender seu horizonte de análise até 2011. Dessa forma, a autoridade monetária disse trabalhar com uma meta de superávit primário - economia para pagamento de juros - ""sem ajustes"" de 3,3% do PIB. A meta para 2011 ainda não foi fixada pelo governo, o que ocorrerá só em abril, por meio da Lei de Diretrizes Orçamentárias. .

A expectativa do BC de cumprimento da meta cheia, sem descontos, difere do cenário para 2009 e 2010, anos em que o governo deve lançar mão de instrumentos para abater investimentos da meta. Isso, na prática, reduz a meta a ser perseguida pelo governo. Para Bernardo Wjuniski, da Tendências Consultoria, a menção à política fiscal de 2011 tem um recado implícito de que o BC vê a política fiscal mais frouxa de 2009 e 2010 como atípica, e que ela voltará ao normal em 2011.