Título: Governo acelera negociações para pular polêmicas em ano eleitoral
Autor: Samarco, Christiane
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/12/2009, Nacional, p. A10
Planalto já fechou, por exemplo, acordos salariais com 1,4 milhão de servidores, livrando Dilma de pendências
O empenho do Palácio do Planalto para limpar o ano eleitoral de problemas políticos e administrativos é tão grande que o governo adotou a tática de "pular 2010" no calendário das agendas de negociações polêmicas do Executivo e do Legislativo. Além de patrocinar acordos salariais com 1,4 milhão de funcionários públicos, tirando pendências e reivindicações do caminho da ministra e pré-candidata Dilma Rousseff (Casa Civil) durante a campanha presidencial, o governo mandou ampliar o alcance das negociações em estatais e empresas públicas.
A estratégia é negociar todos os reajustes salariais de 2010 antes de o ano começar, ao mesmo tempo em que, no Congresso, os governistas trabalham para enterrar formalmente as CPIs mortas-vivas (da Petrobrás, das ONGs e do MST) e apressar projetos que ajudam no discurso eleitoral - como os do pré-sal. Na ofensiva dupla do Planalto, ou se fecham acordos bianuais, ou se empurram com a barriga soluções que possam interessar à oposição.
O governo tentou até que bancos públicos fechassem um acordo conjunto para este e o próximo ano, como revela o ministro Paulo Bernardo (Planejamento), de olho na data-base dos bancários, em setembro, bem às vésperas da eleição de 3 de outubro. Irritado com a recusa do Banco do Brasil em fechar 2010 agora, o ministro adverte que, se o objetivo da negativa foi pressionar o governo na reta final da campanha, os bancários não terão sucesso. "A mobilização não influenciará o resultado da eleição", aposta o ministro do Planejamento.
Traduzido em cifras, o entendimento com o funcionalismo custará ao Tesouro R$ 40,15 bilhões no ano que vem. Isso sem contabilizar o aumento real do salário-mínimo, com um reajuste na faixa dos 9%, e das aposentadorias - cada ponto porcentual a mais na folha da Previdência Social equivale a R$ 2 bilhões.
Na dúvida, o governo comemora a negociação bem-sucedida com os 80 mil funcionários da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT). Depois dos 13 dias de greve nacional em setembro, que deixaram 42,3 milhões de correspondências e 182 mil encomendas retidas nos centros de distribuição dos Correios, a diretoria da empresa foi orientada a trabalhar com números mais generosos por um acordo bianual, que pulasse 2010. Nada de tumultuar a campanha com paralisações de serviços públicos.
Como a proposta inicial de 4,5% de reajuste de salário foi rejeitada, a ECT dobrou a oferta para 9% , desde que os funcionários não buscassem reposição salarial no ano que vem. Como no Executivo federal e em outras estatais, o acordo incluiu melhoria de benefícios, a exemplo do valor do tíquete-refeição que, no caso dos Correios, subirá 13,79% em dois anos. No conjunto, o impacto na folha de salários será de R$ 303 milhões em 2009 e de mais R$ 349 milhões no próximo ano.
Na semana passada, o ministro José Pimentel (Previdência) admitiu que o governo vai adotar, nesta semana, outra medida para evitar que se arrastem até 2010 as negociações com as centrais sindicais e a Confederação Brasileira de Aposentados e Pensionistas (Cobap) sobre o reajuste dos benefícios previdenciários acima do salário mínimo. Como essas negociações envolviam também o reajuste do próprio salário mínimo, ficou decidido que será editada uma medida provisória para desatrelar os assuntos e dar aumento 6,2% aos aposentados.
MILITARES
Servidores fardados das três Forças Armadas não entram em greve, mas as mulheres insatisfeitas com o soldo dos maridos militares costumam fazer um barulho que não convém ao governo, sobretudo em ano eleitoral.
Por isso mesmo, o acordo salarial com o setor também já foi feito, ao custo de R$ 10,8 bilhões no ano que vem. Esse é o valor dos reajustes concedidos ao pessoal da ativa, da reserva e seus pensionistas, em um total de 612 mil pessoas.
Para o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), a pressa nestes casos se justifica porque o Executivo tem limites legais e prazo curto para discutir e conceder reajustes em ano de eleições. "Além de ficar mais vulnerável à pressão a partir de abril, quando a campanha começa oficialmente, o governo corre o risco de ser questionado na Justiça por conta de um aumento de salário, que pode ser taxado de medida eleitoreira", diz Jucá.