Título: Fábricas cinquentonas de carros se tornam as mais produtivas do País
Autor: Silva, Cleide
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/12/2009, Economia, p. B8

Reformadas, fábricas antigas produzem mais carros por hora do que as novas unidades da mesma empresa

Na corrida para garantir fatia significativa no mercado - um dos mais competitivos do mundo, com 13 marcas produzindo localmente -, as montadoras brasileiras aceleram o ritmo de produção com estratégias diversificadas. A Fiat, por concentrar todos os seus produtos em uma única fábrica, é a que consegue o volume mais alto: são 180 carros por hora, ou três por minuto, com três turnos operando 24 horas.

Empresas que dividem a produção em duas ou três filiais estão obtendo volumes maiores nas fábricas mais antigas, onde conseguiram neutralizar ineficiências de prédios e máquinas antigas com modernização de sistemas produtivos e redução de desperdícios. A unidade da General Motors instalada há 80 anos em São Caetano do Sul, no ABC paulista, produz atualmente 58 carros por hora em dois turnos (cerca de 16 horas diárias), enquanto a filial de Gravataí (RS), inaugurada em 2000, faz 50 unidades.

Produzir mais, no entanto, não significa maior eficiência ou maior produtividade. "O custo de produção de um carro em São Caetano é praticamente o dobro do custo de um carro em Gravataí", afirma José Eugênio Pinheiro, vice-presidente de Manufatura da GM América do Sul. Ele leva em conta custos como mão de obra e logística.

A fábrica gaúcha opera com vários fornecedores no mesmo terreno e produz os modelos Celta e Prisma numa região em que os salários são mais baixos em comparação aos do ABC. Já a fábrica de São Caetano está espremida no meio da cidade, sem condições de expansão física, e produz gama maior de veículos, entre os quais o Astra e o Vectra.

"Há 15 anos produzíamos 38 carros por hora e, desde então, promovemos mudanças na fábrica, como a transferência da produção de componentes para nossa unidade em Mogi das Cruzes (SP), além de um amplo programa de eliminação de desperdícios", conta Pinheiro.

O desperdício inclui, por exemplo, o tempo gasto pelos funcionários para buscar peças usadas na linha de montagem. Hoje, as peças chegam ao funcionário em carrinhos, alguns deles automáticos, sem necessidade de deslocamento do operário. Segundo Pinheiro, cada segundo a menos numa estação de trabalho (tempo que o carro fica parado em cada ala de trabalho) significa um acréscimo de 3 mil carros por ano.

PUXADINHO

O presidente da Fiat, Cledorvino Belini, credita parte do alto desempenho da fábrica de Betim (MG) ao processo que ele chama de "mineirização de fornecedores", que levou para Minas Gerais cerca de 170 fabricantes de componentes, a maioria deles instalados no máximo a 20 quilômetros de distância da fábrica. A empresa pode, assim, dedicar-se exclusivamente à montagem dos modelos Mille, Palio, Punto, Idea, Linea, Siena, Stilo, Strada, Weekend, Fiorino e Doblò.

Única montadora brasileira a concentrar toda a produção em uma única fábrica, a Fiat tira da linha de montagem de Betim, inaugurada em 1976, 800 mil veículos ao ano, volume que, segundo a empresa, só perde para uma empresa da Rússia.

Com "puxadinhos" construídos nos últimos três anos para reduzir gargalos mais urgentes, transferência de serviços para terceiros e de aparte da linha para a fábrica da Iveco em Sete Lagoas e da filial argentina, a companhia italiana vem adiando a construção de uma nova fábrica.

Belini também desafia a análise da maioria dos consultores que atua no setor automobilístico nacional e internacional. Eles pregam que, para ser eficiente e produtiva, uma fábrica moderna deve ter capacidade máxima para 200 mil veículos ao ano. "Para nós, a estratégia está funcionando e vamos mantê-la", diz o executivo. "Se precisarmos ampliar ainda mais a produção, damos um jeito."

A fábrica da Volkswagen na Via Anchieta, em São Bernardo do Campo, também no ABC, já foi ameaçada de fechar as portas por pressão feita pela diretoria da empresa para obter acordos de flexibilização de jornada e salários com os trabalhadores. Hoje, produz 68 carros por hora, segundo membros da Comissão de Fábrica, dos modelos Gol City, Polo, Saveiro e Kombi, enquanto a fábrica de Taubaté faz 43 veículos/hora (novo Gol, Parati e Voyage) e a do Paraná, 35 (Fox e Golf).

A fábrica Anchieta foi inaugurada há 50 anos e também passou por inúmeras reformas ao longo dos últimos anos e hoje é cotada para receber a maior parcela do investimento de R$ 6,2 bilhões anunciado pela Volkswagen para o período de 2010 a 2014.

Outra que também foi ameaçada de fechamento é a Ford de São Bernardo. Instalada na cidade em 1958, faz atualmente 58 carros por hora dos modelos Ka, Courier e F-250, segundo a Comissão de Fábrica. Já a filial Camaçari (BA), que trabalha com fornecedores dentro da linha de montagem, produz cerca de 40. Por operar com mais turnos e ter processo produtivo mais eficiente, ao longo de um ano o saldo da Ford Bahia, que entrou em operação em 2001, é maior e deve atingir mais de 200 mil modelos Fiesta e Eco-Sport este ano.

Pinheiro ressalta que a unidade da GM de Gravataí, considerada pelo grupo uma das mais modernas em todo o mundo, deve voltar a ultrapassar São Caetano em volume de produção/hora em breve.

A unidade está sendo preparada para ampliar a capacidade produtiva anual de 240 mil para 350 mil veículos, o que exigirá ampliação de prédios, solução que não pode ser usada em São Caetano. As restrições para o crescimento na unidade mais antiga do grupo, contudo, não impediu inovações.

"Seria mais fácil ir para outro lugar e começar do zero, multiplicando o conceito de Gravataí", admite Pinheiro. "Mas vamos aproveitar todas as oportunidades para melhorar o processo produtivo de São Caetano e temos a ambição de torná-la ainda mais competitiva." A GM também tem uma fábrica em São José dos Campos - a maior das três em área construída - onde são feitos os modelos Corsa, Meriva, Montana e Zafira. A produção por hora varia de acordo com cada linha.