Título: FHC também enfrentou resistência de militares
Autor: Mendes, Vannildo ; Nossa, Leonencio
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/01/2010, Nacional, p. A4

Luiz Inácio Lula da Silva não é o primeiro presidente a enfrentar resistências dos militares em questões relacionadas a direitos humanos. Seu antecessor, Fernando Henrique Cardoso, também teve de lidar com o problema. A diferença entre os dois talvez esteja na maneira de agir.

Em 1995, no primeiro ano de governo, Fernando Henrique teve o cuidado de se reunir informalmente com seus ministros militares para dizer-lhes que pretendia promover reparações no caso das pessoas mortas, desaparecidas, torturadas ou presas na ditadura. Como não existia o Ministério da Defesa, a reunião ocorreu na casa do ministro da Marinha, almirante Mauro Pereira.

O presidente contou-lhes sua própria história de perseguido político, explicou que a reparação não era uma questão política e sim de direitos humanos e, por fim, anunciou que criaria uma comissão especial sobre mortos e desaparecidos políticos e iniciaria um processo de reparações. O episódio está narrado no livro de memórias A Arte da Política: A História que Vivi. Segundo o relato, a reunião terminou em clima cordial. Os ministros "não opinaram, já que era decisão tomada por seu chefe, mas receberam-na com naturalidade".

Apesar da precaução, quando foi anunciado o pagamento de indenizações às famílias das vítimas, houve reações. O ministro da Marinha, o anfitrião do encontro com o presidente, criticou publicamente a iniciativa.

Na mesma época, ao discursar para oficiais do Exército, Fernando Henrique disse que não pretendia ir além dos limites da Lei da Anistia ? o que implicava não investigar as responsabilidades sobre as mortes ocorridas na ditadura ? como propõe agora o presidente Lula.

A cientista política Glenda Mezaroba, autora de uma tese sobre o ajuste de contas entre Estado e vítimas da ditadura, lembra que as pressões sobre Fernando Henrique ocorreram justamente às vésperas do lançamento do 1º Programa Nacional de Direitos Humanos, em 1996. "O momento é outro", diz ela, "mas a polêmica de agora mostra que ainda não avançamos muito nessa questão."