Título: China não vetará resolução contra Irã
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Fonte: O Estado de São Paulo, 05/02/2010, Internacional, p. A16
Para analista, Rússia ainda é a peça-chave para o governo Obama ampliar, na ONU, o cerco ao regime iraniano
Robert Jervis: professor da Universidade Columbia
Quem é: Robert Jervis
Professor da Universidade Columbia, de Nova York, e um dos maiores acadêmicos da área de relações internacionais
Cunhou o termo "doutrina Bush", ao criticar em artigo a diplomacia do ex-presidente
Embora tenha uma posição diametralmente oposta a dos EUA em relação ao Irã, a China não vetará, sozinha, novas sanções ao país persa, aposta Robert Jervis, professor da Universidade Columbia e um dos maiores acadêmicos de relações internacionais. "A história da diplomacia chinesa mostra que o regime de Pequim sempre evita ficar isolado no Conselho de Segurança (CS)", argumentou, por telefone, ao Estado. "Se os EUA persuadirem a Rússia a aumentar a pressão sobre Teerã, a China se absterá."
Após casos como o cerco chinês ao Google e o anúncio da visita do dalai-lama aos EUA, sanções contra o Irã viraram o imbróglio da vez na relação Washington-Pequim?
Tensões entre EUA e China em uma gama de temas - da economia e aquecimento global até questões de soberania chinesa - demonstram a indisposição do regime comunista de aceitar o que percebe como "concessões" a Washington. Sobre a questão das sanções ao Irã, Pequim tradicionalmente evita o aumento da pressão internacional contra um país, pois entende que isso serviria como um precedente que pode ser usado contra a própria China. É preciso lembrar ainda que a China construiu uma "relação especial" com o Irã, sobretudo no setor energético.
O sr. prevê, então, que a China vetará sanções do CS contra Teerã?
Não. Se olharmos a história da diplomacia chinesa, Pequim tem sempre evitado o isolamento na ONU. Minha hipótese é que, se convencermos os russos sobre uma resolução do CS, a China se absterá. Pequim não é o maior empecilho para se aprovar sanções.
O governo Barack Obama parece agora mais disposto a impor sanções ao Irã. O que mudou?
A Casa Branca acredita ter feito ofertas razoáveis a Teerã, que foram simplesmente ignoradas. Mas, como disse ao Congresso Dennis Blair (diretor nacional de inteligência dos EUA) há dois dias, o regime iraniano não é maluco e faz cálculos de custo-benefício. Em outras palavras, se for infligido algum dano, o Irã recuará. Pessoalmente, acho que Obama errou ao recusar a oferta iraniana para enriquecer urânio fora de seu território.
Em junho, Obama silenciou diante dos abusos do regime contra manifestantes que denunciavam a fraude eleitoral. Agora, a Casa Branca está em campanha pelos direitos humanos no Irã. O que mudou?
A dimensão da repressão aos manifestantes reorientou a diplomacia dos EUA para o Irã. O governo avaliou naquele momento - acredito eu, corretamente - que seu apoio aos protestos seria "o beijo da morte" na oposição, que ficaria parecendo pró-americana. Agora, Obama não acredita ser capaz de derrubar o regime pelos direitos humanos, mas tampouco pode se dar ao luxo de silenciar. O presidente não quis colocar direitos humanos no topo da agenda, mas acabou nessa posição por causa do curso dos eventos.