Título: Trichet alerta contra déficits na UE
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Fonte: O Estado de São Paulo, 15/01/2010, Economia, p. B3

Para presidente do BCE, endividamento pode provocar juros elevados e enfraquecer crescimento na zona do euro

SEM EXCEÇÕES - Citando a crise econômica da Grécia, Jean-Claude Trichet diz que o Banco Central Europeu não mudará as normas para favorecer nenhum país

Os governos da zona do euro precisam reduzir seus déficits públicos e adiar cortes de impostos até que seus orçamentos estejam perto do equilíbrio, disse ontem o presidente do Banco Central Europeu (BCE), Jean-Claude Trichet. Em entrevista coletiva, ele afirmou que o elevado endividamento estatal pode gerar juros mais altos no mercado no longo prazo e enfraquecer o crescimento, além de colocar uma pressão adicional sobre a política monetária.

"As necessidades maiores de financiamento dos governos carregam os riscos de resultarem em rápidas mudanças no humor do mercado, levando a taxas de juros de mercado menos favoráveis nos médio e longo prazos", disse ele. "Isso pode abater o investimento privado e enfraquecer as bases do crescimento sustentável."

"Os governos devem concentrar seus esforços para cumprir o Pacto de Estabilidade e Crescimento, reduzir seus déficits a partir de, no máximo, 2011, e tirar a prioridade dos planos de cortes de impostos", acrescentou. Ontem o BCE manteve inalterada a taxa básica de juros, em 1%. A taxa, termômetro do crédito nos 16 países da zona do euro, encontra-se nesse nível desde maio de 2009.

A decisão era esperada, já que a lenta recuperação e a ausência de inflação estimulam a manutenção da política monetária do BCE. A prudência se vê reforçada pela crise orçamentária na Grécia, que está se tornando o teste mais sério para a união monetária e econômica desde sua criação em 1999.

Ontem Trichet refutou a ideia de que a Grécia possa ser forçada a deixar a zona do euro por causa de seus problemas com o déficit público e com o nível da dívida. Mas, ao mesmo tempo, disse que o BCE não oferecerá "tratamento especial" ao país. O presidente do BC europeu descartou dar condições de empréstimos aos bancos gregos mais facilitadas do que as que o BCE oferece ao sistema bancário da zona do euro.

Trichet disse que a noção de que a Grécia deixaria a União Europeia é "uma hipótese absurda" e recusou-se a comentar a respeito. No entanto, ao ser perguntado se consideraria continuar aceitando os bônus gregos como garantia, mesmo que eles não apresentem os ratings suficientes para se qualificarem para os empréstimos, mostrou-se menos receptivo.

"Não vamos mudar nossas normas sobre garantias em favor de qualquer país", disse Trichet. O BCE reduziu o nível de rating aceitável como garantia em suas operações de financiamento para BBB na esteira da crise financeira, mas disse que vai retornar ao tradicional nível mínimo de A- no fim do ano. Há ampla preocupação entre os participantes do mercado de que a dívida do governo da Grécia possa não ter o rating mínimo exigido até o fim do ano, por causa dos rebaixamentos pelas agências internacionais de classificação de risco de crédito.

Trichet disse que examinará cuidadosamente os passos do governo da Grécia. O primeiro-ministro, George Papandreou, afirmou ontem que o governo fará o que for necessário para consertar as finanças públicas, acrescentando que "não há tempo a perder". Durante encontro do gabinete, o ministro das Finanças, George Papaconstantinou, detalhou as metas para o déficit nos próximos anos, que incluem diminuir o déficit para 8,7% do Produto Interno Bruto este ano e 5,6% do PIB em 2011.

Até o fim de 2012, o objetivo é que o déficit tenha caído para 2,8% do PIB, e diminua novamente em 2013 para 2,0%, segundo o governo grego.

FRASES

Jean-Claude Trichet Presidente do BCE "Não vamos mudar nossas normas sobre garantias em favor de qualquer país"

"Os governos devem concentrar seus esforços para cumprir o Pacto de Estabilidade e Crescimento, reduzir déficits a partir de, no máximo, 2011, e tirar a prioridade dos planos de cortes de impostos"