Título: Observatório da corrupção será radiografia de processos da Justiça
Autor: Macedo, Fausto
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/02/2010, Nacional, p. A8

Dirigente da OAB defende mecanismo de controle social para monitorar ações contra colarinho-branco

Entrevista Ophir Cavalcante Júnior: novo presidente da OAB

Ophir Cavalcante Júnior, novo presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), defende a criação de um observatório da corrupção - mecanismo de controle social para monitorar o curso de ações judiciais contra o colarinho- branco. Incomoda-o a impunidade de fraudadores do Tesouro e o País na 75ª posição no índex das nações mais corruptas, segundo a organização não-governamental Transparência Internacional.

No cargo desde segunda-feira, Ophir avalia que o MST é um "movimento social legítimo", mas que deve ir para o banco dos réus quando promove violências e baderna no campo. O programa Bolsa-Família, considera ele, é necessário no Brasil de excluídos, mas deve ir além. "Deve apontar a porta de saída. Não basta apenas dar o dinheiro, mas condições para que isso seja cobrado a fim de que aquela pessoa não se deseduque, não se torne massa de manobra."

Aos 49 anos, 27 de advocacia trabalhista e cível, o presidente da OAB é paraense de Belém e filho de Ophir Filgueiras Cavalcante, que já ocupou a mesma cadeira nos idos de 1989/1990. Em entrevista ao Estado, Ophir falou de suas metas na presidência de uma entidade que abriga 700 mil advogados em todo o País.

Que é o observatório da corrupção?

A gente tem de acreditar que existe remédio para combater a corrupção. A grande maioria quer o País nos trilhos, sem impunidade. O observatório será uma radiografia dos processos no Judiciário. O monitoramento será feito a partir do recebimento da denúncia do Ministério Público, mas sem nenhum tipo de influência porque isso não nos cabe. O objetivo é dar um retorno à sociedade, fiscalizando a ação da Justiça.

Por que não há corruptos nas cadeias do Brasil?

A ausência do colarinho-branco nas prisões se deve à nossa própria legislação, que permite muitos recursos protelatórios. Além disso, o princípio constitucional da presunção da inocência, que é sagrado e do qual não podemos jamais abrir mão, exige provas robustas e irrefutáveis para que se ordene a prisão de alguém. Um fator que alimenta a corrupção é o loteamento de cargos públicos, prática que precisa ser extirpada. A administração tem de ser profissional, independer de quem esteja no governo. Temos de criar uma burocracia técnica, de carreira de Estado. Não pode ser burocracia de governo.

Qual a saída?

Para que não eternizemos a impunidade precisamos de modificações na legislação infraconstitucional. O combate à malversação do dinheiro público deve ser tratado com absoluta prioridade pela Justiça. São processos que dizem respeito a valores éticos e morais da sociedade. A violação desses valores, o dinheiro nas meias, isso abala a sociedade. Causa descrédito nas instituições e a consequência é o destemor do corrupto.

Um sistema processual com tantas brechas não interessa também ao advogado?

O advogado pauta sua conduta dentro de princípios éticos e daquilo que a legislação oferece e impõe. Se a lei oferece recursos, o advogado não vai deixar de usá-los. Não podemos atribuir ao advogado a demora nos processos judiciais. Temos de abreviar o processo, sempre respeitando o amplo direito de defesa.

Anistia vale para torturador?

A OAB quer a verdade e foi ao STF para requerer a abertura dos arquivos da ditadura. Temos de conhecer a nossa história e resgatá-la. Para construirmos uma história sem repetir os mesmos erros. A Ordem entende que o crime de tortura é imprescritível e deve ser apurado pelo devido processo legal.

Os militares defendem investigação também para quem assaltou e matou nos anos de chumbo. O que pensa o sr.?

Depende do viés ideológico de cada envolvido. Não se justifica, por questão ideológica, assalto a banco e tortura a quem assaltava banco.

Censura ao "Estado" passa de 180 dias...

Não há democracia que tenha se fortalecido sem liberdade de imprensa. Estamos vivendo exemplos muito ruins na América Latina. Se tolhermos a imprensa, mais restrições teremos à liberdade do voto e à autonomia das instituições. A liberdade de imprensa tem de ser plena. Se houver abuso, deve ser apurado em processo legal. Censura prévia, jamais. É voltar ao Estado de restrição das liberdades.