Título: Obama volta a desafiar China e diz que receberá dalai-lama
Autor: Trevisan, Cláudia
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/02/2010, Internacional, p. A11

Pequim, que já se irritara com venda de armas a Taiwan, faz dura advertência à Casa Branca

RIGOR - Obama ouve perguntas de estudantes em Nashua: presidente ignora ameaça chinesa de impor sanções a empresas americanas

O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, planeja se encontrar com o líder espiritual do Tibete no exílio, o dalai-lama, apesar do alerta do governo chinês de que tal encontro pode afetar as relações entre os dois países, já estremecidas com a venda de armas americanas a Taiwan.

"O presidente já havia alertado aos líderes chineses durante sua visita no ano passado que se encontraria com o dalai-lama e ele realmente pretende fazer isso", disse o porta-voz da Casa Branca, Bill Burton. "Esperamos que nossas relações com a China sejam maduras o bastante para que possamos trabalhar em áreas de mútua preocupação, como clima, economia global e não-proliferação e discutir francamente sobre as áreas que discordamos", acrescentou.

O governo da China advertiu ontem que suas relações com os EUA podem ser "seriamente prejudicadas" caso Obama se encontre com o dalai-lama durante a visita que o líder tibetano fará a Washington neste mês. Os laços bilaterais estão abalados desde o fim de semana, quando Pequim reagiu com fúria ao anúncio de que os americanos venderão US$ 6,4 bilhões em armas a Taiwan.

"Se o líder dos EUA decidir encontrar o dalai-lama desta vez, isso certamente ameaçará a confiança e a cooperação entre a China e os EUA", declarou ontem Zhu Weiqun, o representante do Partido Comunista responsável pelo relacionamento de Pequim com o líder tibetano no exílio.

Obama já fez um gesto de boa vontade antes de sua visita à China, em novembro, quando decidiu não receber o dalai-lama durante a visita do líder espiritual aos EUA, em outubro. Segundo o jornal Washington Post, foi a primeira vez que isso ocorreu nas 11 vezes em que o dalai-lama esteve na capital americana desde 1991.

Pequim protesta de modo veemente sempre que um presidente americano - ou de qualquer país - recebe o dalai-lama. A diferença agora é que o encontro ocorrerá em um momento de elevação da temperatura no relacionamento bilateral.

No sábado, a China decidiu suspender a cooperação militar com os EUA em reação ao anúncio da venda de armas a Taiwan e ameaçou impor sanções às empresas americanas que fornecerão os equipamentos, entre as quais estão Boeing, Raytheon, Lockheed Martin e United Technologies.

TAIWAN

Pequim sempre dá declarações contundentes contra a venda de armas americanas à ilha que considera uma província rebelde, mas nunca havia anunciado a imposição de sanções às empresas envolvidas. Taiwan é o lugar para onde fugiram os nacionalistas de Chang Kai-shek derrotados em 1949 na guerra civil com os comunistas. Desde então, os EUA dão apoio militar à ilha e têm o compromisso legal de defendê-la em caso de agressão externa - medida que tem como principal alvo os comunistas chineses. Ao mesmo tempo, Washington reconhece o princípio de "uma só China", pelo qual Taiwan não possui status de país soberano na comunidade internacional.

Antes do confronto pela venda de armas e o possível encontro com o dalai-lama, a relação entre os dois países já estava abalada pela ameaça do Google de deixar a China por causa da invasão de seu sistema por hackers que operam no país.

A multinacional americana declarou que só manterá seu site de buscas em chinês se chegar a um acordo com as autoridades de Pequim para fornecer resultados que não passem pelo estrito crivo da censura local - algo praticamente impossível.

O Google recebeu apoio da secretária de Estado Hillary Clinton, que fez no dia 21 um contundente discurso em defesa do livre fluxo de informações na internet.