Título: Conta da anistia pode ir a R$ 4 bi
Autor: Mendes, Vannildo
Fonte: O Estado de São Paulo, 17/01/2010, Nacional, p. A9
Dos 10 mil beneficiados com direito a reparação econômica, 25 casos tiveram valor acima de R$ 1 milhão cada
A União tem uma conta de R$ 2,6 bilhões para pagar a vítimas da ditadura militar (1964-1985) que tiveram reparação pecuniária aprovada até agora pela Comissão de Anistia. O valor refere-se ao ressarcimento retroativo, em prestação única, e não inclui a pensão mensal vitalícia que cada anistiado passou a receber a partir do dia em que o processo foi deferido. Dos 10 mil anistiados com direito a reparação econômica, 25 casos tiveram valor acima de R$ 1 milhão cada.
A conta da anistia pode chegar a R$ 4 bilhões até o fim deste ano, quando a comissão espera concluir mais 9 mil pedidos de reparação.
Mas a despesa total parece um saco sem fundo. Ficará para o próximo governo um saldo de 3 mil pedidos, além de 3.500 recursos, sem contar que novos processos podem ser abertos. "O protocolo é permanentemente aberto em se tratando de violações imprescritíveis e cuja reparação pode ser requerida a qualquer tempo", disse o presidente da comissão, Paulo Abrão.
Cerca de 60% do montante destinado a anistiados foi para civis perseguidos pela ditadura e 40% para militares. Entre estes se incluem os atingidos em combate a organizações guerrilheiras e os vitimados em atentados. Desde 2004, numa nova interpretação jurídica, militares feridos em atentados e agentes do Estado que sofreram danos em confronto passaram a ter os mesmos direitos das vítimas da repressão política, apesar da forte resistência de Abrão e do ministro da Justiça, Tarso Genro.
De olho na interpretação de que a anistia vale para os dois lados, o cabo José Anselmo dos Santos, considerado pela esquerda como seu maior traidor, está na fila para receber reparação. Os trabalhos da comissão recomeçam em fevereiro e o processo de Anselmo, ex-marinheiro infiltrado na esquerda, cujas delações levaram militantes à prisão e à morte, deve ser julgado este ano.
No total, a Comissão de Anistia, que existe desde 2001, já julgou 53 mil de um total de 65 mil processos. Destes, 33 mil foram deferidos e em 10 mil houve algum tipo de reparação econômica. Restam 12 mil pedidos e mais 3,5 mil recursos a ser julgados. O governo queria zerar o estoque até o fim do ano, mas a comissão, com base na média anual de julgamentos e nos prazos processuais, acha que só dará conta de 9 mil. A maior parte dos processos pendentes e dos recursos a julgar é de militares.
ISONOMIA
Calculada com base na renda máxima que o anistiado teria alcançado se não tivesse sido atingido pelo regime, a pensão mensal vitalícia tem atingido atualmente uma média de R$ 2,9 mil. Mas alguns anistiados conseguiram isonomia com o teto de servidor público, equivalente ao salário de ministro do STF, de cerca de R$ 25 mil. Embora tenham atuado no outro lado, os militares, individualmente, são detentores das maiores indenizações.
Há, porém, valores milionários dos dois lados. A situação só não é mais grave para o erário porque um novo critério interpretativo, adotado desde 2007, permitiu a redução das megaindenizações no julgamento de processos. Desde então, a pensão vitalícia, cuja média chegou a R$ 5,6 mil em 2001, foi reduzida para R$ 2,5 mil. A medida teve impacto também no retroativo, cujo valor médio caiu de R$ 528.642, em 2001, para R$ 214.578, em 2009.