Título: Família ainda espera corpo e reparação
Autor: Nossa, Leonencio
Fonte: O Estado de São Paulo, 17/01/2010, Nacional, p. A10

Falta de documento impede indenização de agricultor que perdeu filho

Em meio ao conflito entre militares e guerrilheiros no Araguaia nos anos 1970, o agricultor Eduardo Rodrigues dos Santos, de 84 anos, perdeu um filho adotivo, Sabino, de 14 anos, na explosão de uma granada abandonada pelo Exército num sítio na Faveira, em São Domingos do Araguaia. O corpo foi levado pelo Exército. Outro filho, Lauro, à época com 16 anos, perdeu a mão esquerda. A mãe, Maria Brito dos Santos, passou a sofrer de coração e morreu tempos depois. Os militares também tomaram o sítio da família, que era vizinha de um destacamento da guerrilha.

A Comissão de Mortos e Desaparecidos, órgão vinculado à Secretaria de Direitos Humanos, ainda não reconhece o caso de Sabino. A alegação é que faltam documentos. O Araguaia é uma região onde ainda deixam de ser feitos registros civis.

Eduardo, preso durante três meses, e os filhos Lauro, Sônia e Irani entraram com pedido de indenização na Comissão de Anistia, do Ministério da Justiça, mas estão sem resposta.

"O problema é que até hoje não deram conta do corpo do Sabino", reclama Mário Brito, outro filho de Eduardo. "A Comissão de Mortos e Desaparecidos diz que a gente não tem como provar a morte." Ele se queixa que, mesmo sem uma das mãos e os testemunhos sobre a explosão da granada, Lauro não tem prioridade no atendimento.

Um dos ativistas que prepararam no começo dos anos 1980 o relatório Brasil Nunca Mais, sobre violações aos direitos humanos na ditadura, o ministro Paulo Vannuchi priorizou, no governo, pedidos de indenização de mortos da esquerda e das cidades. As vítimas pobres do campo, sem vínculos com organizações de resistência armada esperam até hoje pela análise de seus pedidos de reparação.

Na Comissão de Anistia, o quadro começou a mudar com o ministro da Justiça, Tarso Genro, que pediu prioridade para vítimas pobres da ditadura. Cerca de 200 agricultores do Araguaia estão na fila de pedidos de indenização. Outros 44 tiveram o pedido aceito pelo governo no ano passado, mas a Justiça bloqueou o repasse dos pagamentos atendendo a uma ação de advogados do deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ), ligado a setores das Forças Armadas.

FRASE

Mário Brito Filho do agricultor Eduardo Rodrigues dos Santos "O problema é que até hoje não deram conta do corpo do Sabino. A Comissão de Mortos e Desaparecidos diz que a gente não tem como provar a morte"