Título: De Nova York ao caos em 24 horas
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 17/01/2010, Internacional, p. A18

O jornalista americano Gay Talese escreveu no seu livro O Reino e o Poder, sobre a história do New York Times, que repórteres preferem "ver países em ruínas e navios a pique do que uma cena sadia, que compõe boa parte da vida". Eu me lembrei disso enquanto lutava com outros colegas por um espaço em qualquer monomotor de Santo Domingo para Porto Príncipe.

Nós queríamos ver o resultado do terremoto, corpos, fome, tragédia. Mas dizer que preferimos isso à normalidade da vida como afirma Talese? Difícil. Moro na mesma cidade que ele, Nova York.

A terça-feira começou como um dia sem notícia. Tudo mudou ao ser notificado sobre a tragédia no Haiti. Na hora, eu disse que queria vir para cá. No dia seguinte, bem cedo, embarcava para Santo Domingo. Quinta-feira de manhã, estava aqui, no centro das notícias do mundo. Vi cenas que nunca imaginei que seriam possíveis: corpos carbonizados, outros abandonados na rua, incluindo um bebê; pessoas sem comida, sem água, sem nada. Bairros destruídos.

Ver todas essas coisas e escrever as reportagens, com a pressão do horário do fechamento, do texto claro, com a internet caindo, é um dos principais desafios de qualquer jornalista. Mas o importante são as histórias. Haitianos que foram queimados ou enterrados sem identificação. Nunca saberemos quem foram, suas memórias, se tinham filhos ou seus planos, interrompido pelo terremoto. Mas várias pessoas ainda podem estar sob escombros. É por essas histórias que pegamos filas para entrar na Faixa de Gaza e embarcamos em monomotores para Porto Príncipe.