Título: De volta à Ásia
Autor: Hofmeister, Wilhelm
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/02/2010, Espaço Aberto, p. A2

A renovação e o fortalecimento das relações com a Ásia são uma preocupação central da política externa do presidente Barack Obama desde que assumiu o cargo, há um ano. O então primeiro-ministro japonês foi o primeiro chefe de governo que ele recebeu na Casa Branca. A Ásia foi o destino da primeira viagem ao exterior da secretária de Estado Hillary Clinton. Os asiáticos, que são particularmente sensíveis a esses gestos simbólicos e sentiam certa negligência durante o governo de Bush, percebem a nova atenção com gratidão. Em Tóquio, numa referência ao seu nascimento no Havaí, Obama apresentou-se como "o primeiro presidente da América que vem do Pacífico" e prometeu reforçar a liderança de seu país nessa parte do mundo.

Em seus discursos, o presidente geralmente atinge a nota certa. Mas que progresso real, ou mesmo sucesso de sua política para a Ásia, podemos registrar efetivamente?

A relação dos EUA com a China desperta grande atenção no mundo inteiro. Mas as alianças bilaterais de segurança com Japão, Coreia do Sul, Tailândia, Filipinas e - no vasto Pacífico - Austrália são a prioridade número um dos EUA na Ásia. O Japão ocupa lugar de destaque. No entanto, porque o novo primeiro-ministro japonês, Yukio Hatoyama, à imitação, de Obama, prometera uma "mudança", após a vitória eleitoral do seu Partido Democrático do Japão (DPJ) em agosto de 2009, surgiram alguns atritos nas relações bilaterais. Com alguma decepção foi registrado em Washington que Hatoyama cumpriu sua promessa de campanha e substituiu o apoio militar japonês no Afeganistão por projetos de infraestrutura e de formação. Uma frustração significativa no lado dos EUA causou a divergência sobre um acordo para a transferência de uma base militar em Okinawa. Mesmo depois da visita de Obama, em novembro, Hatoyama não estava disposto a que o acordo entrasse em vigor. E provocou irritação adicional quando propôs a criação de uma "Comunidade da Ásia Oriental" para reduzir a "dependência" dos EUA.

A relação EUA-Japão, no entanto, é estável o suficiente para suportar tais irritações. Durante o primeiro ano do governo Obama, em muitas áreas as relações bilaterais Tóquio-Washington, sem dúvida, foram reforçadas. Isso se aplica à cooperação no tema da não-proliferação nuclear, mas também à cooperação econômica. Um novo acordo de "céus abertos" deve entrar em vigor em outubro, para liberalizar a aviação civil entre os dois países. No que diz respeito à Coreia do Norte, existe um processo de consulta com muita confiança. O Japão continua a ser o aliado mais importante dos EUA na Ásia.

Um sucesso de Obama na área da política de segurança foi, sem dúvida, a indicação da Coreia do Norte de querer voltar ao diálogo sobre o abandono do seu programa nuclear. Com algumas visitas de alto nível àquele país, incluindo a missão do ex-presidente Bill Clinton para obter a libertação de duas jornalistas, os americanos cederam às sensibilidades norte-coreanas. Parece que valeu a pena. A sintonia dos norte-americanos com seus parceiros sul-coreanos permanece perfeita.

A cooperação pragmática com a China e seu envolvimento para aceitar responsabilidade nas questões globais são o segundo elemento-chave da estratégia de Obama na Ásia. Reiteradamente contestou os receios de uma eventual dominação conjunta com a China, como parte de uma nova bipolaridade. A crise econômica e financeira mostrou claramente a interdependência de ambos os países. Mesmo assim, não podem resolver sozinhos os novos desafios globais. Um bloqueio como o que promoveram na cimeira do clima em Copenhague não é prova de liderança conjunta. Além disso, Washington não deve irritar seus antigos aliados, como o Japão, e os novos parceiros, como a Índia, por uma cooperação muito estreita com a China.

O que importava a Obama no primeiro ano de governo era a construção de bons contatos pessoais com os dirigentes chineses. Portanto, durante sua visita a Pequim e Xangai, em novembro, ele renunciou a ações espetaculares ou declarações provocantes. O Prêmio Nobel da Paz não falou de direitos humanos nem do Tibete. Em Xangai encontrou-se apenas com estudantes escolhidos a dedo pelo Partido Comunista, os quais não fizeram perguntas críticas nem provocaram respostas inconvenientes. Na mídia ocidental, Obama tem sido repreendido por isso. Mas exatamente isso deve ter reforçado a confiança dos dirigentes chineses no presidente americano.

Igualmente, durante a primeira reunião de um presidente americano com os líderes dos dez países membros da Associação de Nações do Sudeste Asiático (Asean), em Cingapura, Obama demonstrou pragmatismo com respeito a questões de direitos humanos. Ele também falou com o primeiro-ministro do regime militar de Mianmar. Pediu a libertação de todos os presos políticos e um verdadeiro diálogo com a oposição como precondição para a redução das sanções existentes desde 1997. O governo dos EUA, em 2009, teve ainda contatos diretos com Mianmar para promover uma mudança gradual.

O envolvimento da China no sudeste Asiático motivou o novo compromisso dos EUA com as nações da Asean, que se sentiam negligenciados pela administração Bush. O fortalecimento do multilateralismo, outro elemento da estratégia de Washington na Ásia, prevê o quadro conceitual para esse novo relacionamento, que foi recebido calorosamente pela maioria dos países da região.

"Estamos de volta à Ásia", enfatizou Hillary Clinton várias vezes. De fato, no seu primeiro ano de governo, o presidente Obama conseguiu transmitir aos asiáticos que os EUA têm um novo e genuíno interesse em reforçar as relações com esse continente. Superar as irritações nas relações com o Japão, transformar os sinais positivos na Península Coreana em medidas concretas e desenvolver uma comunhão de responsabilidade com a China ficam como desafios do futuro.

Wilhelm Hofmeister é diretor do Centro de Estudos da Fundação Konrad Adenauer em Cingapura.