Título: Mortos em Porto Príncipe já somam 150 mil
Autor: Cólon, Leandro; Dutti, Sérgio
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/01/2010, Internacional, p. A10

Número total no país pode passar de 300 mil; sob os escombros, equipes continuam encontrando corpos

Já chega a 150 mil o número de mortos em Porto Príncipe após o terremoto que destruiu a cidade no dia 12, anunciou ontem a ministra das Comunicações do Haiti, Marie-Laurence Jocelyn Lassegue. A quantidade de mortos começa a se aproximar da estimativa inicial de 200 mil. O balanço inclui apenas corpos recolhidos na capital, sem levar em conta outras cidades, entre elas Jacmel, onde milhares de pessoas morreram. Somadas todas as cidades, o número pode passar de 300 mil. No fim da tarde de ontem, um novo tremor, de 5,5 graus na escala Richter, assustou os haitianos.

O Estado percorreu no fim de semana ruas de Porto Príncipe com prédios condenados, em ruínas, e outros dos quais só restam escombros. Aos poucos, o departamento de engenharia militar começa a retirar o entulho e o concreto. Mas o processo de "desobstrução de vias" é lento e perigoso, porque pode atingir centenas de pessoas que perambulam pela cidade. Debaixo desses escombros, novos corpos - ou pedaços deles - devem ser descobertos pelas equipes de trabalho.

Apesar da polêmica sobre o fim das buscas por sobreviventes, o alto comando da missão da ONU diz que ainda há esperança, embora pequena, de encontrar pessoas vivas. O exemplo é o homem retirado com vida dos escombros no sábado, 11 dias depois da tragédia. Cães farejadores são uma das principais armas neste momento.

Ontem, a reportagem visitou um dos hospitais que recebem os feridos. Na favela de Cité Soleil, a mais pobre de Porto Príncipe, seis grandes tendas foram montadas pela associação Médicos Sem Fronteiras. A maioria das vítimas será ou foi amputada em decorrência do terremoto. Uma mulher, por exemplo, começou a receber ontem as primeiras orientações para mexer a perna, após perder a parte do joelho para baixo.

Outra preocupação na cidade é a segurança - não só dos haitianos como também das equipes que distribuem comida. No sábado à tarde, as tropas americanas, oficialmente responsáveis por entregar alimentos, pediram ajuda da ONU para conter o tumulto num antigo campo de aviação. Num acampamento, um grupo, desesperado, tentava pegar sacos de arroz descarregados de um caminhão por soldados da ONU e americanos.

Ontem pela manhã, a reportagem flagrou três militares brasileiros revistando dois homens suspeitos. Eles foram colocados de costas para uma parede da favela de Cité Soleil, onde tropas dos EUA e do Brasil distribuíam 13 toneladas de comida. Um dos homens carregava um rádio velho com uma pedra dentro. Não se sabe se ele tentava vendê-lo como equipamento em perfeito funcionamento ou o utilizava para guardar o concreto.

Em meio ao cenário de destruição, fome e insegurança, os haitianos tentam retomar a vida. Desde sábado, centenas deles se aglomeram, sob um sol forte, nas filas de bancos em busca do dinheiro que ainda resta na conta. As agências estavam fechadas desde o terremoto. Nos postos de gasolina, a confusão é ainda maior. O Estado identificou, além das desorganizadas filas em busca de combustível, homens com maços de dólar nas mãos servindo de cambistas para trocar pela moeda local, o gourdes.