Título: TCU manda investigar entidade ligada ao MST em Santa Catarina
Autor: Arruda, Roldão
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/02/2010, Nacional, p. A10
De acordo com o órgão, há indícios de irregularidades em convênios
O Tribunal de Contas da União (TCU) determinou à Secretaria de Controle Externo de Santa Catarina o "aprofundamento" das análises de convênios firmados entre o Instituto de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e a Cooperativa dos Trabalhadores da Reforma Agrária de Santa Catarina, que é ligada ao Movimento dos Sem-Terra (MST). De acordo com o TCU, existem indícios de irregularidades na execução dos convênios.
Segundo levantamento feito no ano passado pela organização não-governamental Contas Abertas, a cooperativa catarinense faz parte de um lista de 43 entidades privadas e sem fins lucrativos que recebem recursos federais e que têm no seu quadro de dirigentes, comprovadamente, líderes do MST. Entre 2003 e 2009, ela teria recebido R$ 11 milhões dos cofres públicos, segundo a mesma fonte. A verba destinada à cooperativa no ano passado, no valor de R$ 3,3 milhões, foi 65% maior que a do ano anterior.
A determinação do TCU chama a atenção, entre outras coisas, para a possibilidade de conflitos de interesses. É citado especificamente o caso da Associação Estadual de Cooperação Agrícola de Santa Catarina, entidade encarregada de monitorar e avaliar o convênio.
Um dos diretores dessa entidade, Lucídio Ravanello, já presidiu a cooperativa beneficiada com os recursos públicos. O agravante, segundo o TCU, é que as duas entidades funcionam no mesmo endereço, no município de Chapecó.
Ravanello, de acordo com o cruzamento de informações feito pelo Contas Abertas, é um conhecido líder do MST no Estado. Mas não é só. O diretor da cooperativa que assinou o convênio, Joel Tomazi, também é citado em reportagens e boletins como líder do movimento. O atual chefe da divisão de desenvolvimento de projetos de assentamentos do Incra, Marcelo João Soares, diretamente envolvido com o convênio, já fez parte do quadro social da cooperativa.
O Contas Abertas, que analisa sobretudo a transparência na administração dos recursos públicos, interessou-se pela questão porque, segundo a lei brasileira, entidades, movimentos e pessoas envolvidas de alguma maneira com invasões de terras ou de bens públicos não podem receber recursos públicos. Se isso ocorrer, os órgãos responsáveis pelo controle dos repasses podem suspendê-los.
Em dezembro, o TCU chegou a suspender, por meio de medida cautelar, a execução do convênio com a cooperativa catarinense. O Incra recorreu, interpondo um agravo, e, na quarta-feira, às vésperas do feriado de carnaval, o TCU revogou a cautelar, permitindo a continuidade dos repasses.
"O pleno do tribunal concluiu que não havia elementos para a cautelar e deu prosseguimento ao convênio", disse ao Estado o procurador do Incra em Santa Catarina, Valdez Farias. "O Incra está inteiramente à disposição para qualquer iniciativa de acompanhamento e fiscalização do convênio. Mas não podia concordar com sua suspensão. Os recursos beneficiam 5.162 famílias, distribuídas por 132 assentamentos no Estado. Atende a projetos de 52 cooperativas, a maior parte deles voltados para a agroindústria, o beneficiamento de produtos da agricultura familiar, muito forte em Santa Catarina."
No agravo apresentado ao TCU, o Incra também argumentou que os conflitos de interesses apontados não existem. Argumentou, por exemplo, que Ravanello não é diretor da associação encarregada de fiscalizar o convênio. Ele apenas faria parte do conselho fiscal, sem função deliberativa.
No mesmo acórdão em que revogou a cautelar, o TCU determinou, por recomendação do relator, Augusto Sherman Cavalcanti, que a análise do convênio seja aprofundada.