Título: Um partido verticalizado
Autor: Oliveira, Clarissa ; Rosa, Vera
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/02/2010, Nacional, p. A9

Líderes do PT costumam se gabar de que seu partido dá ao País os maiores exemplos de democracia interna. Em novembro passado, a imagem de "partido de bases" ganhou reforço com a participação recorde de 518.912 filiados em eleições para os diretórios regionais e nacional. Mas bastaram poucos meses para que o caráter cada vez mais vertical da legenda se mostrasse sem pudor.

O documento que traça a estratégia eleitoral para 2010 é taxativo: "Compete ao Diretório Nacional a missão de examinar em caráter terminativo as alianças estaduais." Em outras palavras, eventuais candidatos a governador pelo PT - supostamente apoiados pelas bases - poderão ser "rifados" pela cúpula como forma de viabilizar palanques para a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff.

Pouco importa se o texto é uma mera ameaça, ou forma de prestar contas a possíveis aliados insatisfeitos com a movimentação de petistas nos Estados. O fato é que mais um dos princípios estabelecidos no manifesto de fundação do PT - "queremos construir uma estrutura interna democrática, apoiada em decisões coletivas e cuja direção e programa sejam decididos em suas bases" - passa a soar como ficção.

Em 2002, quando Luiz Inácio Lula da Silva se preparava para disputar sua quarta eleição presidencial, teve de se submeter a uma disputa prévia com o senador Eduardo Suplicy (SP). A disputa revelou que a unanimidade de que Lula desfrutava na cúpula petista não se reproduzia nas bases - dos mais de 170 mil filiados que participaram das escolha, cerca de 15% o rejeitaram. Em 2010 não haverá manifestação "de baixo" - Dilma foi ungida pelo próprio presidente, e o PT apenas disse sim ao não dizer não.

No maior colégio eleitoral do País, o partido não sabe se poderá ou não lançar candidato próprio a governador, pois aguarda o resultado das articulações presidenciais para transplantar Ciro Gomes do Ceará para São Paulo. Em Minas Gerais, que concentra o segundo maior eleitorado, a cédula também pode ficar sem um petista - apesar da força eleitoral de Patrus Ananias e Fernando Pimentel. No terceiro maior colégio, o Rio de Janeiro, o petista Lindberg Farias capitulou às pressões de Lula e desistiu de concorrer.

Já virou um chavão dizer que Lula ficou maior do que o PT. O que não se sabe é até que ponto um engrandeceu e outro apequenou-se.