Título: Retaliação contra os EUA se dará na área de patentes, decide governo
Autor: Formenti, Lígia ; Marin, Denise Chrispim
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/02/2010, Economia, p. B9

Punição foi autorizada pela OMC por causa dos subsídios ao algodão, mas EUA ameaçam com contrarretaliação

O governo brasileiro decidiu que qualquer retaliação que venha a ser adotada contra os Estados Unidos, na área de propriedade intelectual, terá como alvo patentes de medicamentos de empresas americanas.

A punição foi autorizada pela Organização Mundial do Comércio (OMC), no ano passado, no final de um processo, movido pelo governo brasileiro, que condenou os subsídios concedidos pelo governo americano à produção e à exportação de algodão.

Na próxima terça-feira, a Câmara de Comércio Exterior (Camex), receberá o relatório final do grupo interministerial que avaliou a sanção na área de propriedade intelectual, em montante de US$ 299,3 milhões, e também a lista de bens americanos que pode ser alvo de retaliações comerciais, que somarão um prejuízo de US$ 530 milhões.

A lista de mercadorias exclui bens de capital. Os governos do Brasil e dos Estados Unidos ainda negociam uma eventual saída que não passe pelas retaliações.

A medida provisória que define as formas de retaliação sobre propriedade intelectual neste e em casos futuros está na Casa Civil, pronta para receber a assinatura do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, segundo uma autoridade do governo. A retaliação na área de mercadorias já é prevista na legislação brasileira.

A medida provisória MP permitirá a suspensão dos direitos de propriedade intelectual em importações de produtos cujas patentes sejam detidas por laboratórios americanos. Autorizará ainda a suspensão de patentes detidas por empresas americanas no País, a cobrança de uma taxa sobre as remessas de royalties relacionados com a propriedade intelectual e o envio do valor total do royalty aos Estados Unidos.

A missão mais delicada dos ministros que compõem a Camex será definir se o conjunto das retaliações contra os Estados Unidos será registrado na OMC ? e, portanto, efetivamente aplicado. Segundo uma autoridade que acompanha o tema, não é intenção do governo registrar as listas apenas para manter uma carta na manga contra o regime de subsídios dos Estados Unidos. Essa situação já traria, para o comércio bilateral, um prejuízo equivalente ao da retaliação, já que importadores e exportadores a travar os negócios com receio das sanções.

AMEAÇA VELADA

A decisão será tomada sob a sombra de uma ameaça velada de contrarretaliação, disparada na quinta-feira passada pelo novo embaixador dos Estados Unidos no Brasil , Thomas Shannon, horas depois da entrega de suas credenciais ao presidente Lula. Também se dará em um contexto de negociação entre o Itamaraty e a Representação dos Estados Unidos para o Comércio (USTR) para encontrar uma alternativa às retaliações.

Nessas negociações, em Genebra, os americanos disseram não poder reduzir os subsídios ao algodão sem o aval do Congresso do país, que jamais aceitaria esse corte. Sem uma efetiva eliminação de subsídio, o governo brasileiro não terá saída senão aplicar as sanções e arcar com as contrarretaliações dos Estados Unidos, que recairão sobre o setor privado.

A suspensão da punição tenderia a desmoralizar o País, que investiu nessa controvérsia emblemática contra uma subvenção agrícola aplicada por um país desenvolvido. Em especial, o Brasil perderia credibilidade diante de seus parceiros em desenvolvimento da Organização Mundial do Comércio (OMC).