Título: Ministro relator submeteu decisão à Corte Especial
Autor: Domingos, João ; Gallucci, Mariângela
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/02/2010, Nacional, p. A5

No pedido de prisão, procuradores citam caso de tentativa de suborno

BRASÍLIA O ministro Fernando Gonçalves, relator do inquérito que investiga o esquema do chamado "mensalão do DEM" no Distrito Federal, concordou integralmente com os argumentos do Ministério Público Federal. Para o Ministério Público, há indícios da atuação de um grupo criminoso no governo supostamente organizado para desviar e se apropriar de verbas públicas e para apagar vestígios das infrações praticadas.

Uma hora após ter recebido o documento do Ministério Público Federal, Fernando Gonçalves pediu ao presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Cesar Asfor Rocha, que convocasse a Corte Especial. Ele já estava decidido a decretar a prisão de Arruda e dos aliados do governador, mas queria submeter essa decisão à apreciação de seus colegas mais antigos no STJ.

No pedido encaminhado ao STJ, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, e a subprocuradora-geral da República Raquel Dodge sustentaram que as prisões deveriam ser decretadas porque, mesmo com as investigações em andamento, o grupo continuava a atuar para apagar vestígios dos supostos crimes praticados.

Eles fizeram referência expressa ao episódio da prisão em flagrante de Antonio Bento da Silva tentando coagir o jornalista Edmilson Edson dos Santos, o Sombra, a mudar seu depoimento. Para o Ministério Público, foram praticados os crimes de corrupção de testemunha e falsidade ideológica.

"A desfaçatez e desinibição dos agentes de infração penal no uso indevido da coisa pública reclamam decisão proporcional do Poder Judiciário. Cabe ao Judiciário assegurar efetivamente a ordem pública, paralisando a atuação ilícita desse grupo criminoso e prevenindo a ocorrência de outros crimes que venham a praticar", sustentaram.

Os integrantes do Ministério Público observaram que a suposta conduta do grupo traz prejuízos para todo o País. "O orçamento do Distrito Federal é, em sua maior parte, constituído pelos tributos arrecadados de cidadãos moradores de todos os Estados do Brasil", frisaram.

O Ministério Público Federal ressaltou que o grupo controla a Câmara Legislativa do Distrito Federal, que é encarregada de processar e julgar os pedidos de impeachment do governador. "Outra evidência da desfaçatez da ameaça à ordem pública decorrente da atuação do governador Arruda decorre do fato de que policiais civis do Estado de Goiás foram detidos em frente à Câmara Legislativa, onde tramita o processo de impeachment, com equipamentos de escuta telefônica", acrescentaram.

De acordo com os procuradores, há indícios de que os policiais, como revelou o Estado, teriam sido contratados por uma pessoa vinculada ao governador para realizar escutas telefônicas em deputados de oposição.

PRINCIPAIS TRECHOS DO VOTO DO MINISTRO DO STJ

"Os indícios coligidos até o momento neste Inquérito 650 revelam traços marcantes e consistentes da existência e do modo de atuar, com vínculo regular e estável, de um grupo de pessoas - dentre as quais o governador José Roberto Arruda e o conselheiro Domingos Lamoglia, do Tribunal de Contas do Distrito Federal, que têm foro criminal por prerrogativa de função nesta Corte -, as quais parecem se organizar e atuar de modo criminoso para desviar e se apropriar de verbas públicas do Distrito Federal e, também, para apagar os vestígios das infrações que praticam."

"Fatos recentes, desvendados no último dia 4 de fevereiro de 2010, indicam que as investigações em curso não paralisaram, nem inibiram a atuação criminosa de um grupo de pessoas que, ocupantes de cargos públicos, aproveitam-se de suas funções para praticar crimes e para, de modo criminoso, apagar os vestígios dos crimes que cometem."

"A organização criminosa instalada no Governo do Distrito Federal continua valendo-se do poder econômico e político para atrapalhar as investigações e, assim, garantir a impunidade."

"O grupo criminoso exerce o comando do GDF, atua no desvio e apropriação de dinheiro público que deixa de atender a finalidade prevista e agora está apagando os vestígios da sua ação criminosa mediante corrupção de testemunha e falsificação de documentos. Também atua no controle dos parlamentares da Câmara Legislativa, encarregados de processar e julgar o pedido de impeachment."

"A desfaçatez e a desinibição dos agentes de infração penal no uso indevido da coisa pública reclamam decisão proporcional do Poder Judiciário. Cabe ao Judiciário assegurar efetivamente a ordem pública, paralisando a atuação ilícita deste grupo criminoso."

"Como exposto, há fortes indícios da participação do governador Arruda no pagamento de vantagem pecuniária a uma testemunha do Inquérito 650, para coagi-la a mudar o depoimento"