Título: Homem do nada a declarar era símbolo de um regime que não prestava contas
Autor: Figueiredo, Talita
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/02/2010, Nacional, p. A9

Por conta da frase "nada a declarar", que repetia de forma quase automática ao ser abordado por jornalistas, Armando Falcão entrou para a história como um dos símbolos de um regime que se considerava desobrigado a prestar contas para a população.

Como ministro da Justiça do governo Ernesto Geisel, de 1974 a 1979, Falcão comandava o aparato policial que impunha a censura às artes e à imprensa no Brasil ? sendo o Estado um de seus principais alvos.

Na época, artistas como Dias Gomes e Chico Buarque de Hollanda tiveram obras proibidas. Até o grupo de balé Bolshoi, da então União Soviética, foi impedido de se apresentar no País.

Em 1989, após lançar o livro de memórias Tudo a Declarar, o ex-ministro manifestou-se contra a volta da censura à imprensa. "É impossível fazer uma censura política adequada, satisfatória e aceitável", declarou, em entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura. "Em segundo lugar, a censura impede a fiscalização da administração pública pela imprensa." No mesmo programa, porém, ele acrescentou: "Sou a favor da censura de diversões públicas, principalmente quando se tratar de televisão, porque a televisão, no Brasil, está se transformando, sobretudo através da telenovela, em um fator de destruição da família brasileira."

Nascido no Ceará, em 1919, Falcão começou a vida pública em 1950, ao conquistar uma vaga de deputado federal pelo PSD. Apesar de integrar uma das legendas de sustentação do governo de Getúlio Vargas, fazia oposição acirrada ao então presidente, conforme registra o Dicionário Histórico-Biográfico Brasileiro, editado pela Fundação Getúlio Vargas.

Em 1954, Falcão atuou como um dos articuladores da candidatura presidencial de Juscelino Kubitschek, então governador de Minas Gerais. Após a vitória de Juscelino, ele foi líder e vice-líder do PSD na Câmara dos Deputados, até ser convidado para ocupar o cargo de ministro da Justiça, em 1959. Ficou no cargo até o ano seguinte, quando Jânio Quadros foi eleito presidente.

Quando Jânio renunciou ao cargo, em 1961, Falcão se alinhou aos políticos e militares que tentaram vetar a posse do vice-presidente João Goulart. No governo de Jango, destacou-se como militante contra a reforma agrária e a influência dos sindicatos na política.

Apoiou o golpe de 1964 e tornou-se um dos interlocutores do primeiro presidente da ditadura, o general Humberto Castelo Branco. Em 1965, aplaudiu a decretação do Ato Institucional n° 2, que extinguiu os partidos políticos, limitou os poderes do Legislativo e estabeleceu a escolha dos presidentes da República por via indireta.

Em 1974, voltou ao Ministério da Justiça a convite de Geisel. No cargo, coordenou a fusão entre os Estados da Guanabara e do Rio de Janeiro. Durante sua gestão foi editado o chamado "pacote de abril", em 1977, que, entre outros pontos, determinou a eleição indireta de 1/3 dos senadores, como forma de evitar o avanço da oposição no Congresso.