Título: Cérebro rejeita desigualdade
Autor: Orsi, Carlos
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/02/2010, Vida&, p. A19

Estudo americano mostra que situações de injustiça produzem um desconforto natural

O cérebro de uma pessoa "rica" se alegra quando um "pobre" ganha algum dinheiro, mas o cérebro do "pobre" não acha graça em ver o "rico" enriquecer ainda mais, o que sugere a presença de um instinto de aversão à desigualdade instalado no cérebro humano. "Ricos" e "pobres", no caso, são voluntários de um experimento envolvendo ressonância magnética e distribuição desigual de dinheiro.

O estudo, realizado por pesquisadores dos Estados Unidos e da Irlanda, foi publicado na revista Nature.

"Nós vemos atividade em partes do cérebro associadas à resposta a recompensas quando voluntários observam a si mesmos ou outras pessoas recebendo vantagens monetárias em potencial", explica um dos autores do trabalho, John O"Doherty, do Instituto de Tecnologia da Califórnia (Caltech), em entrevista ao Estado.

Na realização do estudo, voluntários, divididos em duplas, receberam US$ 30 cada e, em seguida, participaram de sorteios onde, dependendo do resultado, cada um foi designado "rico" (recebendo US$ 50 a mais) ou "pobre" (não recebendo nenhum dinheiro extra).

Os voluntários das duplas foram então submetidos a ressonância magnética funcional do cérebro, enquanto um pesquisador propunha novas transferências de dinheiro para um ou outro membro, analisando a atividade de áreas que reagem ao recebimento de recompensas.

Tanto "ricos" quanto "pobres" tiveram aumento na atividade cerebral das regiões analisadas quando recebiam a proposta de obter mais dinheiro.

O cérebro dos "ricos" animava-se mais quando a proposta de ganho era feita ao "pobre" do que quando era dirigida a si mesmo. No caso dos participantes "pobres", o efeito era o oposto: a área de recompensa do cérebro era mais estimulada por ganhos próprios do que por pagamentos aos "ricos". Em contraste com os dados cerebrais registrados, os "ricos" afirmaram que davam mais valor aos pagamentos recebidos pessoalmente do que aos feitos aos "pobres".

Com a ressalva de que a evolução biológica de fenômenos com a aversão à desigualdade não é sua área de especialização, O"Doherty cita a necessidade de coesão dentro dos grupos humanos como uma possível causa do senso de justiça.