Título: Governo sofre derrotas na votação de emendas aos projetos do pré-sal
Autor: Madueño, Denise
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/02/2010, Economia, p. B8

Emenda que destina parte dos recursos do pré-sal para recompor valor das aposentadorias é aprovada por 356 a 1

Começou mal para o governo a votação dos projetos do pré-sal na Câmara dos Deputados. Na noite de ontem, o Planalto sofreu duas derrotas acachapantes ao votar a lei da criação do Fundo Social a ser constituído com recursos da produção e comercialização do petróleo da camada do pré-sal. Uma emenda, proposta por um deputado da base governista, Márcio França (PSB-SP), destinou parte do dinheiro do fundo para investir na recomposição do valor das aposentadorias acima de um salário mínimo.

A emenda foi aprovada por 356 votos a favor e um único contrário. A emenda diz que no mínimo 5% da parte do Fundo Social reservada ao combate à pobreza deve ser usada para a recomposição das aposentadorias. Quando os líderes da base aliada tentaram aprovar uma "emenda à emenda", propondo um destino genérico ao dinheiro, falando em investimentos para os "segurados da Previdência Social", o governo sofreu a segunda derrota: 309 votos contra 92 e uma abstenção.

Apenas o PT e o PMDB votaram a favor dessa manobra em torno da proposta mais genérica, para não obrigar o governo a destinar o dinheiro para as aposentadorias acima do mínimo.

A recomposição dos benefícios da Previdência acima do salário mínimo está numa proposta apresentada pelo senador Paulo Paim (PT-RS) que tramita na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, mas já foi aprovada no Senado. Por ordem do Planalto, que alegou falta de dinheiro, os líderes do governo barraram a tramitação mostrando que o custo da recomposição custará cerca de R$ 76 bilhões ao ano - agora o Fundo Social do pré-sal será a fonte dos recursos.

QUATRO PROJETOS

O texto básico do projeto de lei do Fundo Social havia sido aprovado na noite de terça-feira, ficando para ontem a decisão de plenário sobre 14 emendas. O relator do projeto foi o deputado Antonio Palocci (PT-SP), ex-ministro da Fazenda. Para contornar as pressões eleitorais, já havia ampliado o leque de destinações dos recursos do Fundo Social, que financiará programas e projetos de combate à pobreza e de desenvolvimento de educação, cultura, saúde, ciência e tecnologia e mitigação e adaptação às mudanças climáticas.

O projeto do Fundo Social é uma das quatro propostas do marco regulatório do pré-sal encaminhadas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Congresso em setembro do ano passado. A proposta de criação da Petro-Sal, estatal que fará a gestão dos novos contratos, foi encaminhada ao Senado em novembro. O governo ainda precisa aprovar na Câmara a capitalização da Petrobrás e concluir a votação do novo modelo de exploração, onde o Planalto corre outro risco de derrota por causa da divisão de receitas com a cobrança de royalties.

A derrota de ontem à noite foi a primeira sofrida pelo Planalto sob a liderança do deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), novo líder do governo na Câmara. O projeto aprovado pelos deputados vai agora ao Senado, onde o Planalto enfrenta problemas constantes nas votações - a maioria é frágil e o governo sofreu na Casa uma derrota histórica, em dezembro de 2007, quando foi aprovado o fim da cobrança da CPMF, o imposto do cheque.

"INACEITÁVEL"

Pelo texto aprovado ontem, a destinação do dinheiro do Fundo para as aposentadorias é clara: "No mínimo 5% dos recursos a serem aplicados no combate à pobreza serão destinados a um Fundo Específico, a ser gerido pelo Ministério da Previdência Social, para recomposição da diferença entre o que foi recolhido em salários mínimos e efetivamente pago pela Previdência Social a seus segurados".

"É uma emenda inaceitável", afirmou Palocci. "Essa emenda anula, nega e inviabiliza o Fundo Social", reclamou José Genoino (PT-SP). Os apelos de Vaccarezza contra a aprovação da proposta não surtiram efeito na base aliada, preocupada com o desgaste de rejeitar uma emenda que beneficia os aposentados em ano eleitoral.

Durante todo o dia, o PT ficou sozinho contra a emenda do deputado Márcio França. Primeiro, numa manobra regimental, o governo tentou evitar a votação nominal, quando os votos não são registrados no painel eletrônico, mas foi derrotado pelos próprios aliados. Depois, tentou derrubar a proposta no voto, mas, quando percebeu o tamanho do prejuízo que teria, recorreu à negociação, mas não conseguiu segurar a base.