Título: Empresas apostam na visita de Hillary para evitar retaliação
Autor: Chade, Jamil
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/02/2010, Economia, p. B1
Multinacionais farmacêuticas querem evitar quebras de patentes americanas por causa do subsídio ao algodão
Multinacionais do setor farmacêutico propõe soluções à crise do algodão entre Brasil e Estados Unidos e apostam na vista da secretária de Estado norte-americana, Hillary Clinton, ao País como um início de uma solução pacífica para a disputa envolvendo a eventual retaliação brasileira contra produtos americanos. O setor farmacêutico seria um dos atingidos por uma eventual retaliação.
Hillary chegará ao País no dia 3 e a questão da sanção brasileira estará na agenda de seus encontros com o chanceler Celso Amorim. Em 2009, o Brasil ganhou o direito de retaliar os EUA em mais de US$ 800 milhões por conta dos subsídios ilegais dados pelos americanos ao setor do algodão.
Segundo o tribunal da Organização Mundial do Comércio (OMC), os EUA violaram a determinação de retirar os subsídios. O Brasil, então, passou a criar uma série de medidas para, na realidade, adiar ao máximo a decisão de aplicar a retaliação, esperando um sinal dos americanos de que poderiam achar uma solução sem que o caso gerasse prejuízos. Amorim já até deixou claro que, se os americanos oferecerem uma solução ao caso, o Brasil abriria mão de uma retaliação.
Legalmente, o Brasil tem o direito de retaliar os americanos em patentes, o que seria a primeira vez que isso ocorreria na história da OMC. O governo já emitiu uma Medida Provisória tornando legais medidas como a suspensão de direitos de propriedade intelectual e a retenção de royalties. Para o governo, a retaliação em patentes seria a única forma de garantir uma pressão suficiente sobre os americanos para forçar uma mudança em sua política de subsídios ao algodão.
O setor farmacêutico não disfarça que se opõe frontalmente à medida. "Isso não vai resolver o problema, que é o do algodão, e criará um novo problema", disse o diretor executivo da Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa, Antonio Britto, que está em Genebra para reuniões na OMC com a delegação brasileira. A entidade reúne empresas brasileiras, mas várias multinacionais americanas que seriam afetadas pelas medidas.
Em sua avaliação, nem o setor farmacêutico, nem o setor do algodão querem, e o governo "não prefere" a opção pela retaliação. "Seria a primeira vez que todos os envolvidos não querem uma retaliação", disse. O setor do algodão quer benefícios aos produtores agrícolas. Já o governo evitaria o peso político de impor retaliações.
O setor farmacêutico apresentou no fim do ano passado um pacote de propostas ao governo sobre como o assunto poderia ser resolvido. Uma das propostas seria a criação de um fundo com recursos americanos para promover pesquisa para o setor produtivo brasileiro. Outra solução seria garantia de maior acesso aos produtos têxteis brasileiros e ao algodão no próprio mercado americano.
Hillary, apesar de desembarcar com a vontade de evitar uma sanção, tem suas mãos atadas pelo Congresso americano. O governo de Barack Obama tem sofrido para passar qualquer tipo de legislação pelo Poder Legislativo e uma mudança em subsídios de um dos setores mais poderosos da agricultura hoje parece improvável.
Mas os setores que sofreriam uma retaliação brasileira também fazem pressões política na Casa Branca para evitar que paguem o preço das distorções provocadas pelos subsídios na agricultura americana.
No Brasil, o temor é de que a sanção crie um ambiente negativo para investimentos no setor de remédios. O setor estima que vá receber investimentos no valor de US$ 2 bilhões de multinacionais neste ano. "Por enquanto, as empresas farmacêuticas não estão freando seus planos por contas da ameaça", garante Britto.