Título: EUA sobem tom com Brasil sobre Irã
Autor: Mello, Patrícia Campos
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/02/2010, Internacional, p. A20

Valenzuela pede que Lula seja ''mais enérgico'' com Teerã; tema estará 'no topo da agenda' de visita de Hillary

COCHICHO - Lula e Funes em San Salvador: ''Se presos no Brasil entrassem em greve de fome, não sei se o governo soltaria'', diz brasileiro

Os EUA levarão ao governo brasileiro um recado: é um "erro" o Brasil não apoiar sanções contra o Irã no Conselho de Segurança da ONU, disse o principal diplomata de Washington para a América Latina, Arturo Valenzuela. A secretária de Estado, Hillary Clinton, vai subir o tom em sua visita a Brasília na quarta-feira, nos encontros com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e com o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim. Hillary vai insistir na necessidade de unidade internacional para pressionar o Irã, segundo apurou o Estado.

"Queremos que os brasileiros sejam mais enérgicos com os iranianos", disse ontem Valenzuela, que é secretário-assistente de Estado para o Hemisfério Ocidental. "Se o Brasil não usar seu relacionamento com o Irã para pressionar os iranianos a cumprirem suas obrigações internacionais, nós vamos ficar decepcionados."

Em San Salvador, no encerramento de seu giro pela América Latina, Lula rejeitou a pressão americana. "Eu vou visitar o Irã e não tenho de prestar contas a ninguém, a não ser ao povo brasileiro", disse o presidente.

O Irã se transformou em uma fonte de irritação nas relações Brasil-EUA. O presidente Lula recebeu seu colega iraniano, Mahmoud Ahmadinejad, em Brasília em novembro. Lula deve retribuir a visita em maio, quando vai a Teerã.

Os americanos estão irritados com a iniciativa de Lula de receber Ahmadinejad de braços abertos e a relutância em apoiar sanções contra o país no Conselho de Segurança da ONU. O Brasil tem afirmado que o Irã não deve ser isolado pela comunidade internacional - exatamente o contrário do que pretende a Casa Branca.

Ontem, em depoimento ao Congresso, Hillary foi taxativa: "Estou a caminho da América Latina. E o Irã está no topo da minha agenda." Segundo a secretária de Estado, os EUA mostraram a países que estavam "ambivalentes" o tipo de ameaça que o Irã representa. "Vamos atrás de pressão e sanções para mudar o comportamento e mandar um sinal internacional claro de que o programa de armas nucleares do Irã não é permitido."

"DECEPÇÃO" REGIONAL

Depois de se reunir com Amorim e Lula em Brasília, Hillary segue para São Paulo, na tarde do dia 3. Lá, ela vai visitar a Universidade Zumbi dos Palmares e pode se encontrar com o governador José Serra.

O giro de 5 dias pela América Latina começa no dia 1, em Montevidéu, onde Hillary participa da posse do presidente eleito do Uruguai, José Mujica. Lá, ela terá um encontro bilateral com a presidente argentina Cristina Kirchner.

Depois, Hillary vai ao Chile, Brasil, Costa Rica e Guatemala. Serão três temas principais na agenda para a região: competitividade, democracia, e combate ao narcotráfico.

A reunião de Hillary com Cristina em Montevidéu já começou mal. A presidente argentina declarou em entrevista à CNN que "Obama não correspondeu às expectativas" que tinham na região, apesar de ninguém estar esperando "um príncipe num cavalo branco".

Segundo Cristina, há uma sensação de "oportunidade perdida" na América Latina. Para ela, Obama cometeu um "erro" por não ter adotado uma posição mais enérgica "contra o golpe de estado em Honduras". A Argentino ficou melindrada porque o país não foi incluído no giro de Hillary. Marco Aurélio Garcia, assessor especial do Planalto, também falou no ano passado sobre a decepção da região com as políticas de Obama.

Ontem, Valenzuela discordou e disse que Obama é mais popular na região do que os próprios presidentes. "Nas pesquisas de opinião, tanto Hillary quanto Obama têm altos índices de popularidade. Na verdade, eles são bem mais populares que os próprios presidentes da região."