Título: Brechas na lei ajudam Lula a fazer campanha no cargo
Autor: Gallucci, Mariângela
Fonte: O Estado de São Paulo, 05/03/2010, Nacional, p. A8

Permissões são tantas que quase não há diferença entre a liberdade dada ao candidato à reeleição de 2006 e ao patrocinador de Dilma neste ano

Por conta de regras eleitorais consideradas "frouxas", o presidente Luiz Inácio Lula da Silva terá grande liberdade para fazer campanha a favor da ministra Dilma Rousseff neste ano, desde que siga as poucas imposições da Justiça Eleitoral. Na opinião de ministros e ex-ministros do Tribunal Superior Eleitoral consultados pelo Estado, Lula poderá participar ativamente da campanha de sua escolhida.

O rol de permissões é tão extenso que quase não há diferença entre a liberdade usufruída pelo Lula que foi candidato em 2006 e a concedida ao Lula patrocinador da candidatura Dilma neste ano.

Lula poderá, por exemplo, aparecer no programa eleitoral da ministra, ir a comícios, dar declarações favoráveis à campanha dela, fazer pequenas reuniões no Palácio da Alvorada para discutir a campanha de Dilma, subir em palanques, viajar no avião presidencial e usar o carro oficial para participar de eventos de campanha, desde que seja feito o ressarcimento dos gastos.

A democracia brasileira completa 25 anos neste ano. Já houve cinco eleições presidenciais diretas, mas nunca um presidente esteve tão popular como Lula neste momento pré-eleitoral. Por essa razão, chegou-se a cogitar a possibilidade de ele pedir licença do cargo durante a campanha. De acordo com reportagem no jornal O Globo de ontem, Lula se licenciaria em agosto e setembro para se dedicar em tempo integral à campanha de Dilma, e em seu lugar assumiria o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), único da linha sucessória que não disputará as eleições. O ministro Franklin Martins, da Secretaria de Comunicação Social, contudo, classificou a notícia como "maluquice".

PRIORIDADE

Por diversas vezes, Lula comentou com auxiliares próximos que eleger Dilma é sua "prioridade" este ano. O presidente tem reiterado que não vai cometer o mesmo erro que seus antecessores, que não se empenharam em fazer seus sucessores. Sarney quase não participou da campanha de sua sucessão, em 1989, quando amargava índice baixo de aprovação. Em 1994, Itamar Franco também não era aprovado pela maioria do eleitorado. O tucano Fernando Henrique Cardoso igualmente não tinha altos índices de popularidade em 2002, quando José Serra concorreu ao Planalto. Na ocasião, Fernando Henrique não foi um protagonista da campanha do tucano.

No TSE, a expectativa é de que a oposição questione a atuação de Lula na campanha. Um dos pontos a ser contestados seria o uso do avião presidencial e do carro oficial para deslocamento do presidente para eventos eleitorais da ministra.

Não há uma regra explícita sobre a possibilidade de o presidente usar esses meios de transporte em campanhas de aliados. Há uma regra que permite o uso quando o presidente está em campanha pela reeleição. Mas esse não é o caso de Lula.

Por analogia, depois de executado o transporte, os valores gastos teriam de ser ressarcidos aos cofres públicos. Para ministros e ex-ministros e até advogados que defendem partidos de oposição, o presidente deve andar no avião e no carro oficial na campanha até por razões de segurança. Mas se Lula resolver tirar licença, há dúvidas se poderá usar o carro oficial.

O presidente só deverá ter problemas com a Justiça Eleitoral se usar ostensivamente a máquina pública em prol da campanha da ministra. Ele não poderá usar bens e serviços da administração pública na campanha de sua aliada. Também não poderá autorizar no período eleitoral publicidade institucional dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos.

REGRAS

Além do comportamento no período eleitoral, que começa oficialmente em julho, Lula tem de seguir as regras da Justiça Eleitoral para este semestre, sob pena de ser acusado de fazer propaganda eleitoral antecipada.

Há jurisprudência formada no TSE sobre o que é propaganda antecipada. O tribunal já decidiu que para a configuração de propaganda eleitoral antecipada são necessárias: menção à candidatura; menção ao futuro pleito eleitoral e a alusão à ação política a ser desenvolvida ou às razões que levem o eleitor a crer que o beneficiário ou o autor da propaganda seja o mais indicado ao cargo. Lula, apesar de ciceronear Dilma em inaugurações e eventos políticos Brasil afora, não foi enquadrado pelo TSE, que não identificou, apesar dos inúmeros recursos da oposição, um ato que caracterizasse a antecipação da campanha.

No entanto, o TSE já decidiu multar Lula em R$ 900 mil pela publicação de uma cartilha em janeiro de 2006 louvando realizações do governo federal. De acordo com o tribunal, houve intensa publicidade, com dados comparativos com realizações da administração anterior.