Título: Apesar de atentados, participação nas eleições no Iraque passa de 62%
Autor: Sant'Anna, Lourival
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/03/2010, Internacional, p. A12

Dados oficiais confirmam comparecimento maciço de sunitas; coalizão do primeiro-ministro xiita sai na frente

ÓDIO - Eleitores sunitas de Falluja ao lado de prédio destruído por atentado a bomba, que atribuem ao governo do premiê xiita Maliki

Apesar dos intensos ataques com foguetes e bombas, cerca de dois em cada três eleitores iraquianos saíram para votar no domingo, na segunda eleição parlamentar desde a queda de Saddam Hussein, em 2003. Resultados parciais da contagem de votos em Bagdá e em algumas províncias devem começar a sair só hoje, mas havia ontem indicações de que a coalizão do primeiro-ministro Nuri al-Maliki saiu na frente.

Segundo a Alta Comissão Eleitoral Independente, 11,7 milhões de eleitores foram às urnas, o que equivale a 62,5% do total. A participação ficou abaixo da eleição parlamentar de dezembro de 2005, de 76%, realizada no auge do conflito sectário no país. Os atentados de domingo mataram 38 pessoas e feriram mais de 100.

Além da Al-Qaeda, que havia ameaçado perturbar a votação, há suspeitas de envolvimento de grupos políticos, interessados em prejudicar seus adversários. Controles mais rígidos de identidade nas seções eleitorais também podem ter dificultado a votação.

Integrantes não só da coalizão Estado de Direito, de Maliki, mas também de outros grupos, que acompanharam a apuração, disseram à Associated Press que a legenda do premiê teve um bom desempenho. A coalizão afirma estar liderando a contagem em 9 das 18 províncias.

Maliki, que lidera o Partido Dawa, originalmente xiita islâmico, tenta se apresentar como um político não sectário, embora sua aliança não tenha atraído políticos seculares de peso. Sua votação é maior em Bagdá - que elege 68 das 325 cadeiras do novo Parlamento - e no sul, onde se concentra a maioria xiita, que representa dois terços da população do país. Já nas províncias do norte e do oeste, onde se concentra a população sunita, a mais votada foi a aliança Al-Iraqiya, liderada pelo ex-premiê Ayad Allawi. Ele é xiita, mas de tendência não sectária, e a aliança reúne 11 partidos xiitas, 10 sunitas e 1 turcomano.

O Estado esteve ontem em Falluja, 80 quilômetros a oeste de Bagdá, reduto sunita sob influência da Al-Qaeda. Os eleitores disseram que votaram em candidatos sunitas da Al-Iraqiya. Os moradores de Falluja acusaram o governo Maliki de estar por trás de alguns dos ataques de domingo, segundo eles com a intenção de evitar que os sunitas saíssem para votar.

A suspeita foi reforçada depois que a polícia encontrou um veículo do Exército com foguetes dentro, como os que foram disparados em Falluja, Bagdá e noutras cidades iraquianas no domingo. A cidade sofreu 18 ataques com foguetes e explosivos, que deixaram 6 mortos - 2 policiais e 4 civis.

Apesar disso, a participação sunita parece ter sido alta. Os sunitas, que representam cerca de um terço da população iraquiana, boicotaram as eleições de 2005, o que os deixou sub-representados no Parlamento, potencializando a força política da maioria xiita. A experiência foi traumática.

Nessas eleições, a Comissão de Transparência e Justiça do Parlamento impediu a participação de cerca de 500 candidatos, acusados de ter pertencido ao Partido Baath, de Saddam Hussein. Entre eles estavam integrantes importantes da Al-Iraqiya. A comissão é liderada por deputados da frente xiita sectária Aliança Nacional Iraquiana (INA) e a decisão foi respaldada por Maliki. Ambos se beneficiaram.

Inicialmente, alguns dos sunitas atingidos ameaçaram boicotar as eleições, mas depois conclamaram os eleitores sunitas a comparecer em massa, para não repetir o erro de 2005.

Os votos dos xiitas distribuíram-se principalmente entre Maliki, a INA e a Al-Iraqiya. O premiê sofreu um desgaste por causa das denúncias de corrupção no seu governo e da lentidão no restabelecimento de serviços básicos, como eletricidade e água, depois da guerra de 2003, e também na criação de empregos. As duas queixas estão vinculadas. Muitos iraquianos perguntam-se o que tem sido feito com o dinheiro do petróleo, cuja produção aumentou de 500 mil para 2 milhões de barris por dia.

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