Título: Para idealizador do contencioso, agora é para valer
Autor: Marin, Denise Chrispim ; Chacra, Gustavo
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/03/2010, Economia, p. B4

Pedro de Camargo Neto diz que é a favor de um acordo desde que seja "consistente", e não "intenções futuras"

O especialista em comércio exterior e mentor do painel do algodão,Pedro de Camargo Neto, avalia que o governo agiu na direção certa aodivulgar a lista de bens dos Estados Unidos sujeitos à retaliação e,principalmente, ao indicar um prazo concreto, de 30 dias, para aentrada em vigor. "É para os Estados Unidos entenderem que é paravaler", disse ao Estado.

Camargo Neto idealizou e iniciou ocontencioso do algodão na Organização Mundial de Comércio (OMC),questionando os subsídios americanos, quando era secretário de PolíticaAgrícola do Ministério da Agricultura em 2002. A avaliação doespecialista é que o governo está agindo "com cautela" e que a listadeixou de fora produtos que possam prejudicar o consumidor brasileiro.

"Casocontrário seria dar um tiro no pé", disse Camargo Neto. "Os setores quereclamam de serem incluídos na lista estão sendo muito imediatistas.Deviam ajudar a pressionar os Estados Unidos", completou.

Eledisse que não é contrário a um "bom acordo", com compensaçõessignificativas para o Brasil enquanto os Estados Unidos não reduzem ossubsídios ao algodão, como vem sendo sugerido por algumas entidadesempresariais.

"Mas a troca precisa ter valor e ser consistente.O que Brasil ganhou é muito paradigmático e muito grande para trocarpor boas intenções futuras", disse Camargo Neto. Ele ressaltou, porexemplo, que o Brasil não precisa da ajuda dos Estados Unidos para umfundo de apoio a cotonicultura.

Apesar do reduzido impactoeconômico da retaliação em bens, Camargo Neto avalia que o maisimportante é o gesto político e o comprometimento do País a divulgar,em 23 de março, a lista de patentes que seriam quebradas - nesse caso,sim, algo inédito e um tema bastante sensível para as farmacêuticasamericanas.

"A retaliação em propriedade intelectual é a forçado contencioso. Temos que mostrar que é uma decisão contrária àpirataria, que fortalece os direitos de propriedade intelectual, porquesó não paga royalty quando autorizado pela OMC."

Segundo fontesdo setor privado que acompanham de perto o assunto, a quebra daspatentes pode não ser um instrumento de pressão tão forte quanto oBrasil gostaria. "A força do lobby da propriedade intelectual não cheganem aos pés do lobby agrícola. As farmacêuticas não vão querer colocara mão nesse vespeiro", disse a fonte.

A avaliação dessesanalistas é que o máximo que os Estados Unidos podem oferecer sãomedidas restritas as competências do Executivo, que não seriamsuficientes para pagar a conta, sem autorização do Congresso. "Ninguémquer essa retaliação, nem o Brasil, nem os EUA, mas infelizmente é umchoque vai ter que ocorrer."

PROCESSO TEVE INÍCIO EM SETEMBRO DE 2002

Em setembro de 2002, o Brasil inicia na Organização Mundial do Comércio(OMC) o processo de questionamento dos subsídios concedidos pelosEstados Unidos à produção e exportação de algodão Em agosto de2009, depois de todos os recursos, a OMC autoriza o Brasil a retaliaras importações dos Estados Unidos nas áreas de bens, propriedadeintelectual e serviços, como quebra de patentes e suspensão depagamento de royalties Com base nos valores de subsídios concedidosem 2008, o Brasil poderá retaliar até o valor de US$ 829 milhões - dosquais pelo menos US$ 560 milhões na área de bens. É o segundo maiorvalor de retaliação já autorizado pela OMC Em novembro de 2009, a Camex aprova o início da retaliação ecoloca em consulta pública uma lista com 222 itens que poderiam ter oImposto de Importação elevado para as compras dos EUA. Os produtospoderão ter a alíquota ampliada em até 100 pontos porcentuais Emfevereiro de 2010, o governo publicou medida provisória permitindo aoBrasil aplicar retaliações nas áreas de propriedade intelectual eserviços Depois de sucessivos adiamentos, o governo publicouontem a lista definitiva de bens, com 102 produtos, que terão umimpacto de US$ 591 milhões nas importações norte-americanas As novas alíquotas para importação dos produtos norte-americanos entram em vigor dentro de 30 dias O governo também anunciou ontem que colocará em consulta pública alista que sofrerá retaliações na área de propriedade intelectual(patentes) e serviços. O impacto será de US$ 238 milhões A listade propriedade intelectual deve ser aprovada no próximo dia 23 pelaCamex e ser colocada em consulta pública por 20 dias. O governo prevêum prazo de um a dois meses para fechar lista definitiva apósencerramento da consulta pública