Título: Proposta dos EUA é compensar subsídios
Autor: Marin, Denise Chrispim ; Chacra, Gustavo
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/03/2010, Economia, p. B4

Em visita ao Brasil, secretário do Comércio tenta alternativa "pacífica"

Os Estados Unidos apresentarão hoje uma proposta de compensaçãocomercial ao Brasil como primeiro passo na negociação de umaalternativa "pacífica" às retaliações autorizadas pela OrganizaçãoMundial do Comércio (OMC). A oferta será apresentada nesta manhã aoItamaraty por Michael Froman, conselheiro-adjunto de Segurança Nacionalpara Assuntos Econômicos Internacionais da Casa Branca, que acompanha osecretário de Comércio dos Estados Unidos, Gary Locke, em visitaoficial a Brasília.

Ontem, uma autoridade do Departamento deEstado considerou "dura" a lista de produtos americanos sujeitos àsretaliações, mesmo sabendo da exclusão dos itens que poderiam ter umpeso maior no comércio bilateral e de sua aplicação apenas dentro de 30dias, caso as negociações de uma alternativa venham a falhar. Aautorização da OMC para o Brasil retaliar os Estados Unidos foiresultado de uma controvérsia de sete anos em torno da políticaamericana de subsídios aos produtores de algodão.

Segundo amesma fonte, os Estados Unidos poderão apresentar ainda outra oferta,relacionada a "interesses políticos do governo brasileiro". O conteúdofoi mantido sob sigilo, à espera da conversa de hoje entre Froman e osubsecretário de Assuntos Econômicos e Tecnológicos do Itamaraty,embaixador Pedro Luiz Carneiro de Mendonça.

A expectativa é deque os americanos adotem uma posição conciliadora e não levem adianteuma guerra comercial contra o Brasil, optando por tentar convencer ogoverno brasileiro a retornar para a mesa de negociações, segundoindicaram autoridades ontem.

Nas últimas semanas, empresáriosbrasileiros e americanos deram algumas indicações aos EUA sobre o quegostariam de ver num eventual pacote de compensações ao Brasil. Segundofontes do setor privado envolvidas na negociação, a tendência é que aadministração Obama restrinja as ofertas ao que pode ser resolvidoapenas pelo Executivo, sem entrar no que depende do Congresso.

Entreas propostas apresentadas pelo setor privado, estaria um fundo de apoioà cotonicultura, a transferência das cotas de açúcar de outros paísespara o Brasil, o comprometimento de Obama em se empenhar pelo fim datarifa do etanol que será avaliada pelo Congresso no fim do ano,redução de tarifas para produtos têxteis, e agilizar a queda dasbarreiras sanitárias à exportação de carnes bovina, de frango e suínado Brasil para os Estados Unidos.

O problema é esses temas mexemcom outros lobbies poderosos nos EUA, como os produtores de açúcar oude milho. E também tendem a desagradar outros países, que podem serprejudicados no mercado americano para dar mais espaço aos brasileiros."Para oferecer compensações, os Estados Unidos estão entre o ruim e opéssimo", disse uma fonte.

DECEPÇÃO

Oficialmente, ogoverno dos Estados Unidos se declarou "decepcionado" com asautoridades brasileiras de anunciar que vão elevar em 30 dias a tarifade importação de 102 produtos depois de a OMC autorizar o Brasil aretaliar os americanos por concederem subsídios à produção e àexportação de algodão.

"Estamos muito desapontados por saber queas autoridades do Brasil decidiram levar adiante retaliações contra osEstados Unidos na OMC na disputa envolvendo o algodão", disse emcomunicado oficial Nefeterius McPherson, porta-voz do chefe do UnitedStates Trade Representative (USTR), Ron Kirk. O USTR é órgão do PoderExecutivo americano responsável pelo setor de comércio internacional.

Segundoela, "o USTR está trabalhando para alcançar uma solução nos temasligados à disputa, sem que o Brasil precise recorrer a retaliações,optando por uma solução negociada". O comunicado é encarado como aposição oficial dos americanos, que não quiseram se aprofundar naquestão dos subsídios à produção e à exportação de algodão.

Ogoverno americano pretende se esquivar de mudanças em sua política desubsídios ao setor do algodão. O Itamaraty está ciente do fato de que aCasa Branca tem autonomia apenas para alterar o sistema de garantias decrédito às exportações do setor. Mas dependerá do Congresso parareduzir as demais subvenções condenadas pela OMC.

Para adiplomacia brasileira, a adequação dos subsídios americanos às normasda organização será a alternativa definitiva às retaliações.

Masserá possível alguma flexibilidade. Segundo o diretor do DepartamentoEconômico do Itamaraty, Carlos Márcio Cozendey, o Brasil poderá aceitara compensação comercial, em caráter temporário, desde que hajacompromisso dos EUA de posterior alteração nos subsídios ao algodão.

Emboranão seja a autoridade responsável pelas negociações comerciais dosEstados Unidos, Gary Locke abordará o tema com os ministros da Fazenda,Guido Mantega, e do Desenvolvimento, Miguel Jorge.No entanto, suaprincipal incumbência será detalhar a Iniciativa de Exportação,programa com o qual os EUA esperam dobrar as exportações até 2014, aospresidentes de grandes empresas americanas e brasileiras, que compõem oFórum de CEOs.

ALGODOEIROS

Em paralelo ao esforçodos governos, os algodoeiros dos Estados Unidos e do Brasil discutem acriação de um fundo para a pesquisa e o desenvolvimento tecnológico dosetor brasileiro, que seria bancado pelo governo americano. O fundoteria atuação voltada para questões ambientais, de infraestrutura elogística relacionadas à cotonicultura brasileira.

Segundo opresidente da Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa),Haroldo Cunha, o capital teria de corresponder ao montante de subsídioscondenados pela OMC, US$ 830 milhões ao ano. A Abrapa custeou boa parteda disputa movida pelo Brasil na OMC. Investiu mais de US$ 3 milhões ."Já conversamos com o setor privado americano. Eles estão pressionandoo governo para não terem de pagar a conta", afirmou.