Título: STJ vê provas contundentes
Autor: Moreira, Mariana
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/02/2010, Cidades, p. 29

Para ministro que decretou a prisão, indícios contra Arruda são fortes e incluem bilhete, depoimentos e vídeos

Ministros da Corte Especial do STJ durante o julgamento de quinta-feira: placar de 12 votos a dois a favor da prisão mostra a importância das provas

Durante a sessão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que culminou com a prisão preventiva do governador José Roberto Arruda, na última quinta-feira, o ministro Fernando Gonçalves, relator do Inquérito nº 650-DF, expôs em seu voto uma posição cristalina, ao defender que há sinais evidentes da participação do político e de mais quatro investigados na suposta rede de corrupção envolvendo funcionários do Executivo e do Legislativo locais, além de empresários da cidade.

No voto, o ministro frisou que a decisão foi baseada em provas concretas. ¿Os indícios da participação na grave conduta de tentativa de coação de testemunha vêm de mais de uma fonte e incluem: o bilhete manuscrito; as declarações de Edson Sombra prestadas à Polícia Federal; as declarações de Antônio Bento prestadas à Polícia Federal; as declarações de Geraldo Naves; o envolvimento de Rodrigo Arantes, secretário particular de Arruda, e ainda o envolvimento do ex-secretário de Comunicação de Arruda¿, escreveu.

Para o relator, as declarações de Geraldo Naves confirmam a autenticidade do bilhete enviado pelo governador afastado ao jornalista Edson Sombra. Rodrigo Arantes, de acordo com depoimento de Antônio Bento, teria entregue a ele o dinheiro, que depois seria repassado ao jornalista ¿ na semana passada, Bento foi preso após entregar a Sombra uma sacola com R$ 200 mil. Já o ex-secretário de Comunicação, Weligton Moraes, teria intermediado uma conversa do governador com Edson Sombra.

No voto, de oito páginas, Fernando Gonçalves afirma que, depois de se tornar intermediador da suposta tentativa de suborno, Weligton Moraes teria aumentado o valor do suposto suborno proposto a Sombra. Em um dos dois encontros que eles tiveram no shopping Liberty Mall, Moraes teria oferecido R$ 3 milhões, em vez de R$ 2 milhões, para que Sombra alterasse o teor de seu depoimento e manipulasse as provas colhidas em vídeo.

Em outro trecho da decisão, o ministro relator menciona passagem do depoimento de Sombra, considerado testemunha-chave do caso. Segundo o texto, após ser avisado que não travaria mais contato com o secretário Weligton Moraes, e sim com Antônio Bento, Edson Sombra teria ligado diretamente à casa do governador para cobrar explicações: ¿¿ que por meio de seu celular, o depoente entra em contato com a Residência Oficial (¿), falando com a pessoa de nome Janaína. Disse a Janaína que queria falar com o governador Arruda, dizendo-lhe que não falasse seu nome em voz alta, apenas anotasse em um papel e apresentasse ao próprio governador. O governador atendeu a referida ligação e travou-se o seguinte diálogo: o depoente questionou a troca de intermediário, sendo que o governador Arruda respondeu que `com esse não teremos problema, esse é irmão¿¿. O depoimento esclarece ainda que o irmão em questão é Antônio Bento.

Fundamentos Ao fundamentar judicialmente sua decisão, o ministro ressaltou que os indícios do inquérito revelam traços marcantes e consistentes ¿da existência, do moto de atuar, com vínculo regular e estável, de um grupo de pessoas ¿ dentre as quais o governador Arruda (¿)¿. Ele lembrou ainda que uma função importante do direito penal é zelar pelo bom trato da coisa pública, o que inclui o patrimônio, a moralidade e a confiança da sociedade no cumprimento das regras estipuladas ao bem público, sem desvios ou ilegalidades.

Ao concluir o documento, o magistrado relebra que o crime de corrupção de testemunha prevê pena mínima de três anos e multa, pelo Artigo 343 do Código Penal. Determina ainda o cumprimento imediato do mandado de prisão pela Polícia Federal e, abrindo exceção à lei(1) que regulamenta o assunto, autoriza a prisão em horário especial, após as 18h. ¿Trata-se de um grupo de pessoas unidas para dilapidar elevadíssimas quantias do patrimônio público oriundo de impostos, têm alto poder econômico e político, e estão instalados no âmbito do governo da capital da República¿, conclui Gonçalves.

1 - Inviolabilidade O Artigo 5º, inciso XI, da Constituição Federal estipula que a prisão decorrente de mandado deve respeitar o princípio da inviolabiliadde do domícilio. Dentro da casa do investigado, o mandado só poderá ser cumprido durante o dia, entre 6h e 18h. No entendimento de alguns juristas, o direito à prisão nestes casos se inicia com a aurora e se encerra com o crepúsculo. O Artigo 293 do Código de Processo Penal prevê que, neste período, a prisão pode ser feita sem o consetimento do morador.

Defesa protesta, mas não recorre

Renato Alves

Zuleika de Souza/CB/D.A Press Nélio Machado: para advogado, Arruda não teve direito de defesa

Os advogados do governador afastado do Distrito Federal, José Roberto Arruda (sem partido), não farão mais um pedido de relaxamento da prisão do cliente. Eles vão esperar que o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) se reúna para julgar o habeas corpus, negado ontem pelo ministro Marco Aurélio Mello. Um dos defensores, Nélio Machado descartou a chance de Arruda deixar a prisão antes do carnaval. ¿Não há essa possibilidade. Não está nas minhas pretensões agir dessa maneira (de recorrer da decisão do STF). Esse habeas corpus pode ter e deve ter um julgamento célere¿, afirmou, sobre a análise definitiva do pedido de liberdade de Arruda, que só deve ocorrer quinta-feira.

Machado considerou parcial a decisão de Marco Aurélio, uma vez que o ministro não teve acesso à defesa do governador, acusado de subornar o jornalista Edson dos Santos, o Sombra, uma das testemunhas do suposto esquema de arrecadação e pagamento de propina. O advogado afirmou que, pela primeira vez, a defesa se ¿fará ouvir¿ sobre o caso no plenário do STF.

Nélio Machado destacou ainda que seu cliente não foi convocado para depor após a Operação Caixa de Pandora, deflagrada pela Polícia Federal em 27 de novembro do ano passado. A ação, que revelou o suposto esquema de corrupção no Governo do Distrito Federal e está sob análise do Superior Tribunal de Justiça (STJ), levou o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, a pedir intervenção federal no GDF.

¿O governador não foi chamado em nenhum momento para ser ouvido no processo. Isso é extremamente grave e comprova o timbre de açodamento que essa investigação teve desde o início¿, afirmou Machado. Ele criticou a sessão do STJ que decidiu pela prisão de Arruda e mais cinco envolvidos na tentativa de suborno, quinta-feira. ¿Nem fomos comunicados. Foi uma sessão sem comunicação a quem quer que seja. Julgou-se desnecessária a presença dos advogados.¿

Sucursal e filial Machado não economizou em críticas ao Poder Judiciário, ao Ministério Público e à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). ¿A OAB é sucursal do Ministério Público e filial da Polícia Federal. É sócia da acusação e cúmplice da autoridade policial¿, disse o defensor de Arruda. ¿A Ordem não está se comportando na defesa das prerrogativas constitucionais. Ninguém na OAB leu sequer uma peça. Aliás, não pode fazê-lo, pois não tem legitimidade para isso¿, emendou.

O advogado também desqualificou o jornalista Sombra. ¿O depoimento desse senhor Sombra não tem nenhuma finalidade, nenhuma serventia¿, disparou. Machado deu entrevista coletiva acompanhado de outro advogado de defesa, Cristiano Marona, no hotel Kubistchek Plaza, de propriedade do vice-governador, Paulo Octávio (DEM).

Perfil Moderado e decisivo

Fernando Gonçalves: ministro que decretou prisão se aposenta em abril

Prestes a obter a aposentadoria compulsória, já que completa 70 anos em abril, o ministro Fernando Gonçalves, que determinou a prisão do governador Arruda, é tido por muitos como um juiz de posições moderadas. Em um processo de 2008, votou contra a união estável entre dois homens, mesmo após a jurisprudência do STJ garantir este direito anteriormente, em casos semelhantes. Em outro julgamento, mudou o entendimento da Corte, ao defender que pessoas adotadas poderiam obter na Justiça o direito de conhecer os pais biológicos.

O magistrado é considerado entre os colegas como pessoa de excelente caráter, de fino trato e extrovertida. ¿Quem se aproxima dele começa a gostar. Ele nunca mudou seu tratamento com ninguém por ocupar determinada função¿, salienta o presidente da Associação de Magistrados do Brasil (AMB), Mozart Valadares Pires. Outro aspecto admirado é sua qualificação intelectual. ¿Gonçalves goza de excelente conceito ético e moral. É extremamente zeloso em suas decisões¿, afirmou Pires. Casado e pai de dois filhos, o ministro é avesso a entrevistas.

Mineiro de Belo Horizonte, Gonçalves nasceu em 1940 e diplomou-se em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), aos 28 anos. No início da carreira, atuou como juiz de direito e procurador da República em seu estado natal. Também assumiu as funções de juiz federal do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, foi professor de Direito Tributário e coordenador-geral da Justiça Federal. Foi empossado ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em junho de 1996. É membro da 2ª Seção e da Corte Especial. No ano passado, elegeu-se diretor-geral da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam). (MM)

Opinião do internauta

Leitores de Correio comentaram no site a decisão do ministro Marco Aurélio Mello, de rejeitar o pedido de habeas corpus do governador afastado José Roberto Arruda. Veja algumas opiniões.

Martinho Lutero ¿Só falta o Paulo Octávio e o Roriz.¿

Rogério Dias ¿Esse é um momento histórico, um marco a ser comemorado por todos os que defendem a ética como pilar da política e da democracia. Povo brasileiro, vamos dar mais um troco neles nesta eleição! Vote apenas em quem nunca teve mandato. Vamos varrer o Congresso Nacional e todas as assembleias.¿

Evanildo Santos ¿O Roriz vai voltar a governar o DF e, com ele, o Durval voltará para o comando da Codeplan. Uma pena que o Arruda é amador, teria que ter pedido umas aulas ao Roriz.¿

Iran Oliveira ¿Acho que as investigações ainda estão muitos superficiais. Quando se aprofundarem nos últimos 12 anos de governo arranjarão coisas bem piores e muito mais pessoas envolvidas.¿

Gildésio Nascimento ¿É lamentável, muito decepcionante. Sinto-me bastante constrangido. O melhor governador do DF dos últimos 30 anos, que estava consertando as mazelas deixadas por Roriz, é pego com a mão na cumbuca. Não sei se daqui para frente vou acreditar mais em algum político.¿

Daniel Wilson ¿É, parece que a Justiça está se movimentando. Agora, e os corruptos do PT? Se é para moralizar, que seja geral. Fora Arruda, José Dirceu, Delúbio, Genoíno e o resto da corja do PT.¿

Bruno Lima ¿E o mensalão federal? Quero ver corruptos na cadeia, mas na hora que fala dos corruptos do PT não vejo a mesma atitude dos petistas honestos.¿

Clodoaldo Santos ¿Acho que esse é o dia mais feliz da vida dos brasilienses.¿

Helton Marques ¿Depois da prisão, só falta a intervenção.¿

Sandra Pereira ¿Parabéns, ministro Marco Aurélio. Senti hoje orgulho de ser brasileiro. Brasília merece receber nesse 50 anos de presente uma moralização na política. Essa cultura ultrapassada de que rouba mas faz não tem espaço na capital. Nem tudo que é legal é moral. Fora Paulo Octávio! Você não tem moral para governar.¿

Fernando Vidal ¿Eu não acreditava que isto acontecesse, realmente o Marco Aurélio me surpreendeu.¿

Lupicínio Sousa ¿Parabéns pela iniciativa do nosso Ministério Público da União e ao Judiciário (nesse caso) por não ir contra o pedido do MPU. Agora espero que o STF seja sóbrio e atenda ao pedido do PGR em relação à intervenção federal.¿

Mauro Vilela ¿Quem rouba bens do povo tem que ser punido severamente e sem recursos, que o diga Paulo Maluf .¿