Título: Condomínio de quatro torres só em duas
Autor: Almeida, Roberto
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/03/2010, Nacional, p. A7

Nivaldo Nappi quitou apartamento há sete anos, deposita "aporte" mensal em juízo, mas ainda não tem escritura

Dizia o anúncio, em 2001, que seriam 80 metros quadrados de área útil, sala com terraço, bancada tipo americana, três dormitórios. Piscina e estacionamento próprio. Assim ficaria o Residencial Jardim Anália Franco ? empreendimento da Bancoop no Tatuapé, zona leste de São Paulo ? que até hoje não está pronto. Só duas das quatro torres foram entregues.

Da varanda de seu apartamento, no 14º andar de uma das torres prontas, Nivaldo Nappi, um gráfico de 47 anos, diz que não adiantou nada quitar seu apartamento, em 2003. É que dali ele só enxerga as torres inacabadas ("dois esqueletos"), uma piscina que não saiu da armação de cimento e pouco trabalho. "Minha vontade era colocar uma câmera apontada para a obra só para mostrar ao juiz o andamento", diz, revoltado. Mesmo com o apartamento quitado ? Nappi já desembolsou R$ 195 mil ?, ele ainda deposita em juízo o chamado "aporte". São mais R$ 24 mil em 48 parcelas, para que a obra seja entregue.

Mas o pior, de acordo com o advogado de Nappi, Waldir Ramos da Silva, é que o empreendimento nunca foi averbado. Ou seja, juridicamente, o apartamento quitado não existe. Há apenas um terreno, em nome da Bancoop. E, por conseguinte, não há escritura. "Quando que esse apartamento vai ser meu?", questionou Nappi. "Eu moro em uma coisa que não é minha", emendou outro cooperado, Nivaldo Sabadin. E vendê-lo, segundo ele, é impossível. "Quem vai querer?".

Nappi, Sabadin e outros moradores que se concentraram ontem à tarde no salão de festas de uma das torres prontas disseram que entraram no "esquema Bancoop" pelo "nome forte" do Sindicato dos Bancários. Esperavam morar no que viram nos panfletos distribuídos ? projetos exuberantes, "com cara de Morumbi". Agora reclamam que, por terem obtido direito de depositar o valor em juízo, não podem participar das assembleias. E que não têm voz ativa na escolha da empreiteira para terminar as obras.

"DESESPERO"

Segundo uma moradora que não quis se identificar, a Bancoop "conta com o desespero das pessoas que ficaram de fora". "Os que ficaram de fora" são, nesse caso, os que deveriam morar nos esqueletos do Anália Franco há quatro anos. É o caso de Rogério, filho do aposentado Valdeci Batista da Silva, que manteve o boleto na mão, reclamando dos pagamentos "abusivos".

Contra os moradores do residencial que deixaram de pagar, como Sulivam Gomes de Brito e Aline Rosa de Oliveira Brito, a Bancoop ajuizou ação de reintegração de posse. Ontem, na 3ª Vara Cível de São Paulo a cooperativa não conseguiu reaver o apartamento, avaliado em R$ 91,5 mil. O juiz Luis Fernando Nardelli grifou que "os saldos residuais somente são exigíveis quando devidamente demonstrados, calculados e provados". A Bancoop nunca teria conseguido dizer o quanto eles ainda teriam de pagar para "fechar a conta". Segundo sua assessoria de imprensa, a Bancoop deve recorrer, e o Anália Franco é um empreendimento "em construção".