Título: Antigo apoio à insanidade
Autor: Miranda, Renata ; Costas, Ruth
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/03/2010, Internacional, p. A14

Ao criticar a greve de fome como forma de pressão dos opositores doregime cubano e compará-los a bandidos comuns presos, o própriopresidente Luiz Inácio Lula da Silva antecipou-se às objeções de que jáutilizou esse recurso quando lutava contra a ditadura militar no Brasile classificou a sua antiga atitude de recorrer ao jejum para protestarcomo "insanidade".

Em 1980, Lula e outros metalúrgicos presoscom ele iniciaram o ato de "insanidade". A intenção era não sealimentar até que as negociações entre patrões e empregados fossemretomadas. Quatro dias depois, após uma visita do bispo D. ClaudioHummes, Lula e os companheiros desistiram do protesto.

Cincoanos depois da primeira "insanidade" de Lula, o Brasil saía de vez doregime ditatorial. Cuba continua na mesma até hoje. Não há registro deque Lula recorreu a greves de fome nos 17 anos que passaram do fim doregime militar até a sua eleição em 2002. Mas, em pelo menos duasocasiões, apoiou mais atos de "insanidade".

Numa delas, em 1998,quando os sequestradores do empresário Abílio Diniz iniciaram uma grevede fome para forçar sua extradição do País. Apesar de condenados porcrime comum - que de certa forma teve influência na primeira eleiçãopresidencial disputada por Lula, em 1989 -, reivindicavam a condição depresos políticos.

Ficaram 46 dias em greve e contaram com aajuda de Lula, que foi visitá-los no Hospital das Clínicas em São Pauloe fez gestões diretas com o presidente Fernando Henrique Cardoso. Nocaso dos sequestradores, a greve deu certo e eles foram extraditadospara Chile e Argentina.

Em 2005, já presidente, Lula voltaria ase deparar com o "ato de insanidade". Mas desta vez contra seu governo.Em protesto contra as obras de transposição do Rio São Francisco, obispo Luís Flávio Cappio iniciou um jejum que duraria 24 dias e olevaria para uma UTI. A posição de Lula na época não foi tão enfáticacomo a de agora com os cubanos e chegou até a classificar o protestocomo "ato de grandeza".

No início do protesto, Lula disse que aposição do bispo era compreensível. Pouco antes de o religioso anunciaro fim da greve de fome, Lula disse que, como cristão, considerava essaforma de protesto contrária aos princípios da Igreja e não pode seracolhida por um governante.