Título: Depois do vendaval
Autor: Thomé, Débora
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/03/2010, Economia, p. B4

O PIB de 2009 veio dentro do esperado, com queda de 0,2% para uma projeção de -0,1% estimada pela MB Associados. O sentido de estagnação já pairava desde o começo do ano, o que foi conseguido pelo dinamismo do mercado doméstico vis-à-vis a deterioração das exportações e dos investimentos. Ajudou em muito termos um país com políticas econômicas ainda distorcidas, o que facilitou enormemente o trabalho de estímulo das políticas monetária e fiscal, situação muito diferente dos países desenvolvidos. Em outras palavras, fazer o País crescer no curto prazo é fácil, o problema é manter a expansão no longo prazo.

Para 2010, o PIB deve mostrar uma recuperação em todos os segmentos, com a liderança dada pela indústria e pelos investimentos. Isso não significa, entretanto, que a economia voltou normalmente para a situação pré-crise. Um dos efeitos de dois anos de crescimento forte do mercado doméstico (consumo) e queda do investimento é que a inflação volta a assombrar este ano.

No biênio 2009/2010, o consumo das famílias e do governo agregará R$ 260 bilhões à economia, enquanto os investimentos aumentarão em apenas R$ 10 bilhões. Essa disparidade momentânea é o que justifica a preocupação do BC ao longo do ano.

Além disso, por causa da queda dos investimentos, o PIB potencial também foi afetado. Seu crescimento estava beirando os 4,5% no imediato pré-crise. Com o perfil de crescimento esperado para os próximos dois anos, o PIB potencial deve se estabilizar em torno de 3,8%. Essa é a sinalização de que o patamar de 6% de 2010 não é sustentável para 2011, nem para os próximos anos. A taxa de investimento estará muito aquém ainda do mínimo necessário para um crescimento médio sustentável acima de 5%.

Em nossas projeções, mesmo um crescimento vigoroso da Formação Bruta de Capital Fixo não fará com que a taxa de investimento chegue a 25% do PIB nem em 2016. Junto a isso, segue sendo verdade que não há movimento por parte do governo de estimular a poupança doméstica. Essa é a verdadeira base do crescimento, e não a depreciação da taxa de câmbio, como costuma se propor.

Os dados fortes dos primeiros trimestres deste ano, começando com os 7% de expansão esperados na comparação com o mesmo período do ano anterior, devem dar ótimas manchetes políticas, mas já no quarto trimestre o crescimento do PIB deve começar a definhar. A razão básica é que o descompasso que se vê entre consumo e investimento é espelho do que se vê entre setor privado e setor público.

O primeiro tem condições e disposição para investir, mas o segundo ainda indica um caminho errado de crescimento, via aumento de gastos correntes, e não de investimento. Em alguns anos, o efeito disso será um déficit em conta corrente cronicamente elevado e uma carga tributária cada vez maior.

Mas é inegável que o patamar médio de crescimento hoje é maior do que tempos atrás. A desaceleração que será exigida das políticas fiscal e monetária não precisará ser tão intensa como no passado, o que quer dizer que crescer 4,5% em 2011 não será difícil.

*Sérgio Vale é economista-chefe da MB Associados