Título: Consumo tem alta de R$ 500 bilhões
Autor: Landim, Raquel
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/03/2010, Economia, p. B10

Aumento da renda desde 2003 favoreceu expansão dos gastos das famílias e evitou tombo do PIB em 2009

Os brasileiros gastaram quase R$ 500 bilhões a mais durante os sete anos do governo Lula. O consumo das famílias saiu de R$ 1,47 trilhão em 2002 para R$ 1,97 trilhão no ano passado. Os números são comparáveis porque foi descontada a inflação e os preços atualizados para 2009. O cálculo foi feito pela MB Associados com base nos dados divulgados na quinta-feira pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

As projeções apontam para um crescimento de R$ 150 bilhões nos gastos das famílias brasileiras este ano, o que pode levar o consumo total para mais de R$ 2,1 trilhões. É um número recorde, que ajuda a explicar a alta popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no fim do segundo mandato.

Uma combinação de fatores positivos provocou essa explosão de consumo: crescimento econômico, forte expansão do crédito, geração de empregos (principalmente formais), aumento dos salários, câmbio valorizado e inflação controlada.

"O crescimento é a base, a inflação sob controle mantém o poder de compra e o crédito promoveu a alavancagem do consumo", disse o economista do JP Morgan, Júlio Callegari. Ele ressalta que o crédito ao consumidor (excluindo o imobiliário) saiu de 5% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2002 para 14,8% em 2009 - um patamar semelhante ao dos países ricos.

Na avaliação do economista, outro fator importante para estimular o consumo é a valorização do real, que aumentou o poder de compra da população brasileira em dólares. É um fenômeno semelhante ao que ocorreu em 1994, no Plano Real.

Para o professor da Universidade de Campinas Júlio Sérgio Gomes de Almeida, a geração de empregos com carteira assinada também foi fundamental para o aumento do consumo. "A previsibilidade da renda do emprego formal deu à população condição de gastar mais e tomar mais crédito", explica.

O ritmo de crescimento do consumo não foi uniforme. No primeiro ano de Lula, em 2003, os gastos das famílias chegaram a cair 0,8% por causa da turbulência nos mercados provocada pelas eleições. O ano de 2004 também foi relativamente fraco, com alta de apenas 3,8%.

A expansão do poder de compra ganha ritmo a partir de 2005, e o consumo das famílias cresce 4,5% naquele ano e 5,2% em 2006. A partir do segundo mandato, as taxas superam os 6%, chegando a 6,1% em 2007 e 7,1% em 2008. No ano passado, apesar da crise, os brasileiros consumiram 4% a mais.

O economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale, explica que, no início do governo Lula, o crescimento do consumo ficou concentrado nas classes mais baixas, que foram beneficiadas pelos reajustes do salário mínimo e pelos programas sociais, como o Bolsa-Família.

Na sua opinião, o grande impulsionador do consumo foi o avanço da classe C, que se consolidou a partir de 2005, quando a economia entrou em uma dinâmica positiva - maior crescimento e juros em queda. A participação da classe C no total de famílias brasileiras saiu de 23,7% em 2002 para 25,3% em 2005, e atingiu o recorde de 31,8% no ano passado.

"O Brasil ainda está nascendo para o consumo. O potencial é muito maior", disse Vale. Mais de 60% das famílias brasileiras são consideradas pobres e fazem parte das classes D e E. A MB projeta que, se a expansão da economia persistir, a classe C vai se tornar a maioria da população em 2016.

Mas há muito riscos nesse caminho. Para a economista da Rosemberg & Associados Thaís Zara, o mais grave deles é o ritmo de crescimento se tornar insustentável, por causa da falta de investimento e de baixa poupança interna (ver matéria ao lado). O Banco Central deve elevar os juros e conter o consumo. Outro risco é uma deterioração do cenário internacional, já que a recuperação global ainda não é consistente.