Título: Brasil vê brecha em crise EUA-Israel
Autor: Marin, Denise Chrispim
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/03/2010, Internacional, p. A10

O assessor especial para assuntos internacinoais da Presidência, Marco Aurélio Garcia, insinuou ontem que a posição "cética e dura" dos Estados Unidos em relação a Israel pode resultar na inclusão de outros mediadores, entre os quais o Brasil, nas negociações de paz com a Autoridade Palestina (AP).

Garcia também reiterou que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva cobrará amanhã dos líderes palestinos, em Belém, coesão interna para evitar o fracasso de um eventual acordo de paz com Israel. Teve o cuidado, entretanto, de não repetir à imprensa a intenção de o presidente brasileiro apresentar-se como mediador do diálogo entre a Autoridade Palestina (AP) e o Hamas.

Desde 2007, quando estourou a violência entre as duas facções palestinas, o Hamas governa, isolado, a Faixa de Gaza, enquanto o rival laico Fatah controla a Cisjordânia. Países árabes como Egito e Arábia Saudita tentam remediar a cisão entre palestinos, mas até agora as negociações não deram resultados.

"Se os EUA, que têm se revelado um aliado histórico de Israel, estão com uma posição tão cética e dura, isso provavelmente provocará uma reflexão nos interlocutores. Espero que assim seja", afirmou Garcia. O assessor de Lula referia-se à reação da secretária americana de Estado, Hillary Clinton, ao anúncio de expansão dos assentamentos israelenses em territórios palestinos durante a visita ao país do vice-presidente dos EUA, Joe Biden, na semana passada. Na sexta-feira, Hillary qualificou a iniciativa de Israel como um "insulto" aos EUA.

"A mensagem que o presidente Lula dará ao lado palestino é que a primeira coisa a fazer é unir-se. Se o lado palestino não tiver uma posição coesa, homogênea, qualquer entendimento com Israel ou com quem quer que seja estará fadado ao fracasso", completou o assessor.

Garcia avaliou que a "crise" Israel-EUA não deve minar as negociações de paz com os palestinos. Mas teve o cuidado de esquivar-se de avaliar os componentes políticos internos em Israel e entre as lideranças palestinas, que tendem a tornar esse episódio mais explosivo.

Fundamentalismo. O assessor de Lula preferiu considerar a questão palestina com base em suas grandes repercussões internacionais. Com isso, justificou a pretensão "universalista" do Brasil de envolver-se na mediação do conflito.

"Será que os problemas de nascimento do fundamentalismo, de ameaça terrorista em outras partes do mundo existiriam se a questão palestina tivesse sido resolvida há mais tempo?", questionou Garcia. "Eu não estou querendo dizer que esses problemas vão desaparecer no momento em que houver um acordo de paz. Mas, sem dúvidas, estaríamos suprimindo um fator de desestabilização", afirmou.

"Por isso, o Brasil está metido nisso. Qualquer questão que desestabilize a ordem global nos interessa", concluiu Garcia, para em seguida reconhecer que "não há solução mágica", que o governo não está atuando "ingenuamente" e o País dará apenas uma "pequena contribuição".

Logo depois da chegada a Jerusalém, Garcia confirmou que Lula trará aos encontros de hoje com o presidente israelense, Shimon Peres, e o primeiro-ministro, Binyamin "Bibi" Netanyahu, sua proposta de inserir o Irã na discussão do conflito Israel-palestinos. Teerã, na visão do assessor, tem "influência de peso" nessa questão e não pode ser ignorado.