Título: Políticas econômicas
Autor: Khair, Amir
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/03/2010, Economia, p. B2

Boa parte das análises atribui o sucesso da política econômica do governoao fato de ter dado continuidade ao tripé constituído pelas metas deinflação, pelo câmbio flutuante e pelo elevado resultado primário(receitas menos despesas exclusive juros). A questão do crescimentoeconômico seria uma consequência desse tripé, pois não é citada nessasanálises como parte integrante e fundamental de uma política econômica.

O tripé efetivou-se em 1999, quando da troca de comando no BancoCentral, que passou a adotar o regime de metas de inflação e o câmbioflutuante. O resultado primário elevado surgiu como exigência do FundoMonetário Internacional (FMI) para a obtenção de empréstimos quevisavam a salvar o País do default nas contas externas.

Para satisfazer essa exigência, o governo elevou a carga tributária,que passou da média de 26,8% do Produto Interno Bruto (PIB), no períodode 1995 a 1998, para 30,6%, no período de 1999 a 2002, com crescimentode 3,8 pontos porcentuais (p.p.) do PIB. Nessa mesma base decomparação, o resultado primário passou de um déficit de 0,2% do PIBpara um superávit de 3,3%, ou seja, cresceu 3,5 p.p. entre essesperíodos.

Já o crescimento econômico médio anual no período de 1999 a 2002 foide 2,1%, pouco abaixo do verificado na média do primeiro mandato dogoverno anterior (1995 a 1998), que foi de 2,4%, quando não existia otripé e a inflação era controlada pela âncora cambial. No atual governoo crescimento médio anual até 2009 foi de 3,6%.

Será que o que caracteriza a política econômica é o tripé ou existemtambém outras políticas que merecem reflexão? Por exemplo, o estímuloao consumo, à produção e ao investimento, que são políticas ligadas àeconomia real. Nesse caso, pode-se notar uma diferença entre o governoanterior e o atual.

No anterior a política adotada foi a de atrair o capital estrangeirocomo mola mestra para o crescimento. Foi marcada pela fase de intensasprivatizações com entradas maciças de capital externo para adquirircontrole ou participação nas estatais de então. O foco foi o estímuloao investimento, para a ampliação da oferta de bens e serviços.

Já no governo atual a política tem sido de estímulo ao consumo comomola mestra para gerar o crescimento econômico. É a elevação do saláriomínimo, a intensificação de programas de distribuição de renda, aadoção do crédito consignado e o uso dos bancos oficiais para ampliaçãodo crédito e redução dos juros. Com essa política se ampliou a massa deconsumidores com a incorporação de milhões de pessoas na classe C,gerando, em consequência, o crescimento da produção e do investimento.O foco foi no consumo.

Há divergências se a ênfase deve ser dada aos investimentos ou aoconsumo. Como a maior parte dos investimentos é feita pelo setorprivado e este só investe quando prevê crescimento do consumo, aspolíticas de estímulo ao consumo parecem ser mais eficazes para criaros investimentos e, com isso, um crescimento econômico sustentável.

Outra política econômica de substantiva importância é a do comércioexterior. Aí também há diferenças marcantes. No governo anterior apolítica econômica foi preferencialmente na direção do eixo EUA-Europa,maiores consumidores mundiais. Caso ela fosse seguida neste governo acrise poderia ter efeitos mais perversos.

No atual, a política foi a conquista de novos mercados,especialmente aqueles dos países emergentes, que há mais de duasdécadas apresentavam taxas de crescimento econômico superiores e ondese tem verificado um aumento real e potencial mais expressivo de novosconsumidores.

Enfim, as políticas de estímulo à economia real são tão ou maisimportantes que as do tripé e se somam a ele com o objetivo deconseguir explorar de forma mais efetiva o potencial econômico do País.Ficar apenas considerando política econômica restrita a esse tripé, quebasta adotá-lo que o desenvolvimento econômico irá cair do céu, éempobrecer o debate.

MESTRE EM FINANÇAS PÚBLICAS PELA FGV, É CONSULTOR