Título: Dúvidas jurídicas ameaçam o pré-sal
Autor: Andrade, Renato
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/03/2010, Economia, p. B4

Para juristas, encaminhamento do projeto no Congresso traz incertezas que podem atrasar investimentos em exploração

Osinvestimentos para desenvolver e explorar os campos de petróleo nopré-sal devem sofrer atrasos por causa das dúvidas sobre o novo marcoregulatório. A disputa no Congresso pela divisão dos royaltiesevidenciou, segundo especialistas, os problemas que o governo terá deenfrentar depois que os projetos forem transformados em lei.

"A discussão dos projetos já atravancou os investimentos; vamosdemorar 15 anos para recuperar o que perdemos nos últimos dois anos",disse Oswaldo Dela Torre, advogado do escritório Mattos Filho, de SãoPaulo.

Para ele, um exemplo dos efeitos deletérios da disputa é a falta denovas rodadas de licitação de áreas petrolíferas. "A última granderodada foi em 2008; tivemos uma pífia em 2009 e não teremos nada esteano."

Luiz Antonio Lemos, especialista em petróleo e gás do escritórioTozzini Freire Advogados, do Rio de Janeiro, concorda que a falta derodadas atrasa o início da exploração dos campos do pré-sal. Para oadvogado, a indefinição das regras e a falta de um horizonte clarosobre quando o marco estará plenamente em vigor aumentam apossibilidade de fuga de investimentos.

"Há um ponto de interrogação. O risco de as empresas migrarem paraoutras regiões em que podem continuar fazendo investimentos é grande",disse.

Inconstitucional. A questão do rateio dos recursos obtidos com acompensação devida pelas empresas que exploram petróleo (royalty) éapenas um dos elementos que os especialistas consideram passíveis dequestionamento na Justiça. Mas o problema pode ser considerado atémarginal, uma vez que o cerne da proposta apresentada pelo Palácio doPlanalto - a definição do novo modelo de exploração - também poderá seralvo de questionamento no Supremo Tribunal Federal (STF), caso sejaaprovada no Congresso.

A Consultoria Legislativa do Senado, onde os projetos estão sendoanalisados, fez um levantamento das inconstitucionalidades daspropostas encaminhadas pelo governo em setembro do ano passado. Ainstituição do modelo de partilha na exploração do petróleo por meio delei ordinária é o primeiro ponto questionado pelos técnicos.

De acordo com o estudo, a Constituição deixa claro que a exploraçãode recursos minerais, como o petróleo, só pode ser feita por concessão- o modelo vigente - ou autorização. O estabelecimento do novo regime,portanto, só poderia ser feito por meio de uma proposta de emendaconstitucional (PEC).

O fortalecimento da Petrobrás é outro elemento destacado pelosespecialistas como passível de discussão na Justiça. "As váriaspossibilidades de a Petrobrás poder atuar sem processo licitatório é umexemplo ainda mais flagrante de inconstitucionalidade", comentouOswaldo Dela Torre.

Para os técnicos do Senado, a proposta do governo dá tratamentodiferenciado e privilegiado para a estatal em relação às demaisempresas que disputam o mercado de petróleo e isso representaria umdesrespeito à Constituição e ao princípio da livre concorrência.