Título: Bicos calados
Autor: Kramer, Dora
Fonte: O Estado de São Paulo, 21/03/2010, Nacional, p. A10

Depoisde proclamar com entusiasmo durante os últimos dois anos ainvencibilidade da chamada chapa-puro sangue com José Serra comocandidato a presidente e Aécio Neves de vice, o PSDB reconhece queerrou feio.

Precipitou-se ao comemorar como realidade algo que era apenas umapossibilidade. Real e com muita chance de se concretizar, até pelaforça da lógica de se unir os dois maiores colégios eleitorais doBrasil, São Paulo e Minas Gerais.

Mas não contava com um dado: a escolha do candidato a vice sesobrepor em importância à candidatura presidencial. E pior, não dandocerto ficar a impressão do fracasso, da impossibilidade do cabeça dachapa competir com chance de vitória.

Feita a autocrítica, a ordem geral é bico calado sobre a escolha dovice de Serra. Seja ele Aécio Neves ou qualquer outro. Sim, porqueainda reina na nação tucana a esperança - agora oficial eestrategicamente negada - de retomada do plano original.

Os mais inconformados com a ordem unida ainda falam no assunto.Dizem que a última declaração de Aécio falando que a decisão "dependedo Serra e do partido" soa a uma reconsideração da recusa.

Os mais disciplinados - não por coincidência todos residentes nasproximidades do governador já quase candidato oficial - juram por nossasenhora do bandeirantes que vice é assunto fora da agenda.

Serra diz que pensará no assunto em maio.

Os mais normais preferem não contrariar o bom senso. Informam que opartido examina possibilidades enquanto aguarda uma decisão de Aécioque, segundo eles, dependerá da avaliação que ele fizer da conveniênciaou não da candidatura a vice para o sucesso da eleição do sucessor emMinas.

O governador sai do cargo dia 2 de abril, participa do lançamento dacandidatura de Serra no dia 10 e depois sai em viagem de 30 dias para oexterior. A volta coincide com o mês de maio citado por Serra.

Enquanto isso grassa a especulação. Mediante critérios do que seriaum bom vice. Primeiro que não tire votos, não atrapalhe. Segundo,partido que acrescente ou subtraia do adversário. Terceiro que seja deuma região ou estado eleitoralmente significativos.

A premissa é se a solução será interna ou externa. Se for interna, oque se fala hoje como possibilidade é em Beto Richa, do Paraná, queimplicaria a troca do candidato a governador por Osmar Dias, do PDT.Talvez Sérgio Guerra, de Pernambuco.

Do mesmo estado, aventa-se a possibilidade de Roberto Freire, doPPS, ou Francisco Dornelles, do PP. Este, mineiro, eleito senador peloRio, tio de Aécio, mataria dois coelhos, mas esbarra na dificuldade depertencer a um partido aliado de Lula.

E o DEM? Pois é, uma dificuldade. O partido quer, mas há os critérios no meio do caminho.

Peso médio. É relativa a importância da multa de R$ 5 mil aplicadaao presidente Lula pela Justiça Eleitoral. Em 2006 ele foi condenado apagar R$ 900 mil por causa da edição de uma cartilha consideradapropaganda eleitoral e até hoje a multa é contestada na Justiça.

Referencial. O ministro-chefe da Secretaria Nacional de DireitosHumanos, Paulo Vanucchi, considera "fundamental" para a democracia ocontrole do Estado sobre os meios de comunicação.

"Esse quarto poder tem que entrar na roda do sistema de controlesrecíprocos", defende. Ressalva o cerceamento de liberdades, como oexistente em Cuba.

A reciprocidade a que alude é de mão única, pois a proposta é que se estabeleça um rol do que pode ou não ser divulgado.

Repudia o modelo, mas toma como parâmetro o regime cubano, no lugarde adotar como referência países onde a regra é a liberdade deexpressão como conceito absoluto, preservados os direitos garantidos emleis às quais todos estão submetidos, inclusive a imprensa.

Ademais, não parece que as imperfeições da democracia brasileirasejam decorrentes da liberdade. Antes, ao contrário. Fundamental para oaprimoramento do regime nesses 25 anos de retomada democrática foijustamente a possibilidade de escolha do exercício da independência.