Título: O risco do leilão de Belo Monte é sair de qualquer jeito
Autor: Samarco, Christiane
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/04/2010, Economia, p. B1

Odebrecht e Camargo Corrêa desistiram. O consórcio liderado pela Andrade Gutierrez continua no jogo, mas está relutante. E agora surge um novo grupo, com participação do Bertin, empresa que já teve problemas com concessões públicas. É nesse último pelotão que o governo hoje se agarra para garantir competição no tão aguardado leilão da Hidrelétrica de Belo Monte, um dos trunfos que a ex-ministra Dilma Rousseff pretende apresentar em seu palanque eleitoral.

Até a desistência de Odebrecht e Camargo, o governo achava que as queixas contra as condições do leilão eram apenas choradeira, como já ocorreu anos atrás na disputa pelas usinas do Rio Madeira. Mas até mesmo executivos do consórcio formado por Andrade, Votorantim, Vale e Neoenergia, que continuam na disputa, dizem que o projeto não é economicamente viável do jeito que foi concebido e continuam em busca de mudanças nas regras. Ou seja: ainda não sabem se irão mesmo participar do leilão do dia 20.

A principal divergência está no preço. Os investidores alegam que o projeto não sai por menos de R$ 30 bilhões, enquanto o governo bate o pé em R$ 19 bilhões. As empresas dizem que em Belo Monte é preciso investir muito dinheiro para tirar pouca energia, em razão do regime de chuvas na região. Brasília acha que é blefe.

Se a Andrade Gutierrez for mesmo até o fim, o único oponente - nas condições de hoje - seriam as construtoras de menor potência, lideradas pelo Bertin. O histórico do grupo no setor elétrico registra algumas panes. Em 2008, um consórcio formado pelo Bertin venceu a licitação para construir 21 termoelétricas, mas não apresentou as garantias exigidas no prazo. Por causa disso, foi executada em mais de R$ 20 milhões. O grupo também teve dificuldades com exigências do processo de concessão de rodovias em São Paulo.

Entre as construtoras que podem acompanhar o Bertin no consórcio estão a Queiroz Galvão, OAS, Mendes Júnior e Serveng. Apenas a Queiroz Galvão confirma ter entrado na disputa. Desse grupo, só Queiroz Galvão e Serveng teriam capacidade financeira para uma empreitada como a de Belo Monte. Por outro lado, o mercado não enxerga em nenhuma delas a experiência necessária para executar um projeto com tantos desafios de engenharia. Ontem, o presidente Lula disse que o leilão sairá de qualquer jeito. O risco é sair de qualquer jeito mesmo.