Título: Mercado de IPOs vê investidor mais cauteloso
Autor: Modé, Leandro
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/04/2010, Economia, p. B5

Quatro das cinco aberturas de capital no Brasil em 2010 tiveram ações com preços inferiores ao projetado

Em um mundo amplamente favorável aos investimentos em países emergentes, seria de esperar que operações de abertura de capital de empresas (os chamados IPOs, da sigla em inglês) fossem um sucesso absoluto. Não é, porém, o que tem ocorrido no Brasil em 2010.

Quatro dos cinco IPOs realizados até agora no País - BR Properties, OSX, Aliansce Shopping e Multiplus - iniciaram a negociação de suas ações na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) com preços inferiores ao que se esperava antes da estreia.

A OSX, empresa de estaleiros e serviços petrolíferos do bilionário Eike Batista, por exemplo, estimava que o preço de sua ação ficaria em um intervalo de R$ 1.000 a R$ 1.333,33. Com a fraca demanda, foi obrigada a diminuir a expectativa para R$ 800,00. Na quinta-feira, o papel valia R$ 700,00 na Bovespa.

A única companhia cuja ação ficou dentro da faixa projetada foi a concessionária de estradas Ecorodovias. O papel saiu a R$ 9,50 - o intervalo esperado ia de R$ 9,00 a R$ 12,00.

Analistas afirmam que o desempenho aquém do esperado serve de alerta para as empresas que estudam acessar o mercado neste ano, mas não acreditam que indique uma mudança de humor em relação ao Brasil. Uma prova disso é a atratividade dos fundos de ações do País.

Destaque mundial. Segundo a EPFR, uma empresa americana que acompanha o vaivém dos investidores ao redor do mundo, os fundos brasileiros de ações receberam, nos últimos 12 meses, US$ 16,4 bilhões. Isso faz do País um dos líderes, entre os emergentes, nesse tipo de captação.

"Estamos muito otimistas em relação ao Brasil", afirma o presidente da BlackRock na América Latina, Daniel Gamba. A BlackRock é uma das maiores gestoras de recursos do mundo. Segundo Gamba, a empresa detém hoje US$ 30 bilhões em ações de companhias brasileiras.

Para os analistas, o relativo fracasso dos IPOs em 2010 é explicado, fundamentalmente, pela cautela dos investidores internacionais no pós-crise, e por um otimismo irrealista das companhias que fizeram as operações e os bancos de investimento que coordenaram o negócio.

"Houve uma má precificação desses IPOs", diz o gestor de renda variável da Infinity Asset Management George Sanders, referindo-se à definição de preço dos papéis. "As avaliações foram muito otimistas. (Os bancos e as empresas) acharam que podiam vender qualquer coisa a qualquer preço."

Ganho fácil. A analista-chefe da Corretora Spinelli, Kelly Trentin, concorda. "O mercado ficou mal acostumado com a situação que vigorava até a eclosão da crise, quando os ganhos eram fáceis e rápidos", afirma. "Lá, todo mundo comprava qualquer coisa. Hoje não."

O coordenador de fundos diferenciados do Itaú Unibanco, Guilherme Rebouças, pondera que, de 2007 para cá, houve mais de 100 IPOs no Brasil. "Essas empresas que entraram recentemente na bolsa ainda oferecem boas oportunidades", afirma. Ou seja, são concorrentes das novas companhias que estão acessando o mercado.

Se há um lado positivo da performance fraca dos IPOs até agora, observa Richard Wahba, estrategista para pessoa física da Fator Corretora, é o fato de afastar a ideia de que há uma bolha no mercado acionário brasileiro. "Os investidores estão muito mais racionais hoje", diz. "Para colocar dinheiro no Brasil, estão exigindo bom retorno."

Na semana passada, um executivo do banco suíço UBS para América Latina disse que o fluxo de dinheiro direcionado aos ativos brasileiros faz o mercado acionário do País "parecer uma bolha".