Título: Crescimento acelerado
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 19/04/2010, Notas e informações, p. A3

Passada a crise, a economia brasileira voltou a crescer aceleradamente e muitos especialistas já aumentam suas projeções para o ano. Crescimento também pode ser um problema - um bom problema, como observou há poucos dias o ministro da Fazenda, Guido Mantega, mas nem por isso se deve negligenciá-lo. Poderá passar de 7% a expansão do PIB, em 2010, segundo as novas contas de economistas de consultorias e do setor financeiro. Dá-se como quase certo que a produção interna de bens e serviços tenha sido, no primeiro trimestre, cerca de 2% maior que nos três meses finais de 2009.

Mantido esse ritmo, o aumento neste ano poderá chegar a uns 8,2%, mas a maioria dos analistas aponta como provável uma perda de impulso nos próximos meses. Mesmo assim, o ritmo da atividade poderá intensificar as pressões inflacionárias e prejudicar as contas externas.

Já não se discute se os juros básicos subirão na reunião do Copom do dia 28. A conversa mudou. Antes, quase todos apostavam num aumento de 0,5 ponto porcentual. Muitos falam agora em 0,75. Os indicadores de inflação subiram menos em março do que em fevereiro, mas os sinais de pressão continuaram preocupantes. Os números apontam não só para pressões sazonais e acidentais. Preços de serviços também têm subido e aumentos têm ocorrido na maior parte dos itens cobertos pelas pesquisas.

Há sinais de inflação de demanda. Os investimentos em máquinas têm crescido, mas o consumo não diminuiu nem na crise e sua expansão ainda ganhou impulso no começo de 2010. Nos 12 meses terminados em fevereiro, as vendas do comércio varejista aumentaram 6,9%. No mesmo período, a produção de bens de consumo só se ampliou 0,7%, enquanto a de bens de capital e a de bens intermediários encolheram 12,7% e 3,1%.

O ministro Guido Mantega admite a ideia de tirar o pé do acelerador, mas não a de pisar no freio. Medidas para desaceleração já foram tomadas, segundo ele, com a suspensão de incentivos para as compras de automóveis e de produtos da linha branca. Pode ser, mas ainda não foram detectados sinais claros de contenção do consumo. O emprego e a renda familiar continuam crescendo e os consumidores aparentemente continuam motivados. Além disso, as vendas são facilitadas pelo crédito. O endividamento fácil é um poderoso incentivo ao consumo, provavelmente mais forte que a elevação do emprego e do salário.

Os porta-vozes da indústria e do comércio continuam rejeitando a ideia de um novo aumento dos juros básicos. Segundo argumentam, muitos empresários têm anunciado planos de investimento e com isso a capacidade produtiva continuará ajustada ao consumo crescente. Intenção de investimento, no entanto, não anula pressões inflacionárias já presentes e observadas em vários setores.

Mas também é prudente levar em conta outro efeito da rápida expansão da demanda interna. A importação voltou a crescer mais velozmente que a exportação, como ocorreu nos 12 meses anteriores à crise. Com a redução do superávit comercial - agora estimado em US$ 10 bilhões ou pouco mais, neste ano - amplia-se o déficit na conta corrente do balanço de pagamentos. Já se projeta um buraco de US$ 50 bilhões para 2010 e de US$ 60 bilhões para 2011. São financiáveis e por isso não justificam maior preocupação, segundo a equipe econômica e alguns analistas do setor financeiro. Esse otimismo, no entanto, é perigoso.

Déficit em conta corrente pode ser saudável quando o País investe muito e precisa de capital estrangeiro para completar a poupança interna. Mas o descompasso na conta de mercadorias, com reflexo nas transações correntes, tem resultado de um consumo superaquecido e não de um grande esforço de investimento. Além disso, o exportador brasileiro enfrenta dificuldades num mercado externo ainda retraído. Depois, é forçado a competir em desvantagem, por causa do famigerado custo Brasil. O País já pagou muito caro, muitas vezes, por causa do desajuste no balanço de pagamentos. É melhor não facilitar.